ISSN 2359-5191

25/11/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 104 - Sociedade - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
FEA debate as causas da ausência de mulheres em determinadas carreiras
Núcleo de pesquisas visa fomentar o debate acerca das dificuldades da ascensão profissional feminina
Gravidez impõe pausa na carreira/ Rogério Geraldo

O mês de outubro marcou o início das atividades do 58° grupo de pesquisas da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da Universidade de São Paulo (USP). O Grupo de Pesquisas em Gênero e Raça (Genera) visa fomentar o debate acerca das dificuldades enfrentadas por mulheres, brancas e negras, na evolução e consolidação da carreira e também propor práticas que possam auxiliá-las no desenvolvimento profissional.

Segundo a estatística anual da USP, com base nos dados de 2012, atualmente as mulheres representam 38% dos docentes da Universidade, ou seja, ainda são minoria, mas é possível verificar uma tendência de equilíbrio. Contudo, esta realidade não é homogênea em todas as faculdades da instituição. Na FEA, por exemplo, as mulheres ocupam apenas 18,75% dos cargos de docência e na Escola Politécnica da USP (Poli) o desequilíbrio é ainda maior, pois apenas 10,5% das vagas mencionadas são ocupadas por representantes do sexo feminino.

No mercado externo a realidade é ainda mais aterradora. Segundo dados da pesquisa realizada pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, publicada em 16 de setembro deste ano, as mulheres ocupam apenas 8% dos altos cargos nas companhias brasileiras. O levantamento que obteve informações de 837 empresas de capital aberto entre os anos de 1997 e 2012, avaliou mais de 73 mil cargos e demonstrou certo avanço em relação aos de diretoria executiva, que teve aumentada a participação de 4,2% para 7,7%. Porém, a representatividade feminina nos conselhos administrativos caiu, no mesmo período, de 9,8% para 7,5%, minimizando os efeitos dos dados positivos.

Entre as instituições levantadas está a Natura, empresa de cosméticos com forte apelo junto ao público feminino e que, apesar desta característica, não teve no período da medição, segundo a pesquisa, ao menos uma mulher em seu conselho administrativo.

As dificuldades de inserção das mulheres em cargos que exigem maior grau de capacitação, e em geral são dominados pelos homens, passam por diversos pontos e o evento que marcou o início das atividades do núcleo de pesquisas apresentou alguns destes entraves.

 Carreira X Maternidade

Silvia Pereira de Castro Casa Nova, professora da FEA e idealizadora do Genera, apresentou a questão relacionada ao relógio biológico. Segundo ela, o período de progressão da carreira acadêmica coincide com o momento em que a mulher tem que decidir sobre a maternidade. Caso opte por ser mãe, invariavelmente terá que realizar uma interrupção momentânea no processo de aquisição de conhecimento e o ônus, após este período, em geral está na dificuldade de reinserção.

Rosangela Melatto, diretora responsável por estratégias comunitárias da Intel apresentou a questão da baixa adesão das mulheres a determinados cursos como gerador de certa perpetuação do problema, uma vez que a indústria absorve a mão de obra saída das universidades e as indicações para cargos de chefia são feitas numa relação de semelhança de gênero.

Também salientou as questões culturais que colocam a mulher como responsável pelo cuidar do outro, reduzindo a disponibilidade de tempo para cuidar da própria carreira.

Apesar dos dificultadores, Rosangela destacou o interesse das companhias, com destaque especial para as de tecnologia, da qual faz parte, em criar condições para que as mulheres atuem em cargos de direção, uma vez que cada vez mais, segundo ela, as mulheres são responsáveis por fazer escolhas e a visão feminina no início do processo pode gerar melhores resultados na ponta da cadeia produtiva.

Cíntia Margi, professora da Poli e integrante do grupo Poli Gen, que realiza funções homônimas às do Genera, reforçou a questão das escolhas, mas acrescentou outro dado, relacionado às dificuldades de progressão da carreira. Cíntia destacou que em alguns cursos, como na área de biológicas, por exemplo, há certo equilíbrio entre homens e mulheres que ingressam na graduação. Porém, mesmo nestes cursos, as docentes são minoria, o que demonstra que o peso neste caso fica a cargo das escolhas particulares que podem atuar como inviabilizadores da continuidade dos estudos.

Helena Hirata, professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) apresentou a questão da vulnerabilidade humana e destacou que a autonomia masculina é relativa, pois é necessário que as mulheres, que são mães e esposas, cuidem da casa, roupa e alimentação para que eles possam se dedicar ao trabalho e ao estudo. Para a professora é necessário que haja uma desconstrução do modelo concebido, que coloca as mulheres como cuidadoras quase que exclusivas, para posteriormente se construir um novo modelo de sociedade no qual se verifique uma melhor distribuição das funções entre os sexos. Contudo, A pesquisadora também reforçou que esta reconfiguração social só será viabilizada pela adesão do governo, através de políticas de incentivo ao desenvolvimento profissional feminino, dos movimentos sociais e das universidades.

Por fim, Edgard Cornacchione, chefe do departamento de Contabilidade e Atuária da FEA, retomou a questão dos modelos destacados por Cintia e acrescentou a questão da manutenção de estereótipos verificada como tendência no meio social.

Em entrevista posterior concedida a AUN, quando questionado se as dificuldades de criação de novos modelos estariam na própria sociedade, Edgard respondeu que “Seria difícil negar a importância de modelos no processo de formação de indivíduos, em várias etapas do desenvolvimento”, e salientou que “no caso de educação superior não é diferente. Diversos ambientes sociais, ainda padecem de forte disparidade na representação de seus estratos sociais em seus meios”. “Penso que a própria sociedade é a força que promove essa manutenção indesejada e perigosa. Notadamente essa questão é intensificada ao verificarmos as dimensões de sub-representação de gênero e de raça na sociedade”.

O pesquisador destacou que a superação do problema passa pelo debate, que atua como forma de reconhecimento das dificuldades que inibem a ascensão das mulheres. A partir disto é possível criar estímulos e importar modelos de outras áreas até que as com menor representatividade possam criar seus próprios casos de sucesso.



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