São Paulo (AUN - USP) - O impacto econômico geralmente atribuído aos direitos trabalhistas não justifica a proposta de corte de tais garantias. Assim Marcus Orione, chefe do Departamento do Direito de Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, questiona o discurso que defende as reformas trabalhista e sindical. Os modelos das reformas, importados da Europa, não se adequam à desigualdade social e à precariedade da seguridade social do Brasil. “Na verdade o direito do trabalho e o direito previdenciário não podem ser instrumentos servis a contingentes econômicos porque senão fica muito complicado estabelecer até patamares de dignidade”, diz Orione.
Problemas como o desemprego e o trabalho informal não podem ser resolvidos com a simples diminuição dos direitos trabalhistas. “Você não tem o compromisso necessário e claro de que diminuir os direitos sociais represente o verdadeiro e honesto interesse das empresas em abrir mão do contingente de reserva”, diz Orione. O contingente de reserva é a massa de desempregados. A existência de tal contingente faz com que os empresários proponham condições cada vez piores de trabalho pois, se o empregado recusar-se a trabalhar em tais condições, há muitos outros desempregados dispostos a ocupar a vaga apesar dos abusos. Isso significa que a redução dos direitos trabalhistas não garante necessariamente a inclusão de mais pessoas no mercado formal.
Para o especialista, somente a garantia da seguridade social e dos direitos humanos aos desempregados pode fornecer forças para o trabalhador reivindicar melhores condições, já que este não temerá o desamparo caso perca o emprego. Orione explica que uma nova visão do próprio Direito como instrumento de instauração dos direitos humanos e um novo conceito de trabalho, que inclua funções socialmente importantes que hoje não são remuneradas, poderiam diminuir o intrincado problema do trabalho no mundo. Por isso, os direitos humanos são a atual linha de pesquisa do Departamento do Direito de Trabalho.
Como instrumento de reinvidicação, a associação em sindicatos tornaria o trabalhador mais protegido nas negociações com os patrões. Entretanto a organização é enfraquecida quando há casos de corporativismo e clientelismo em alguns sindicatos brasileiros.
O projeto de reforma sindical contém o fim da unicidade sindical, ou seja, abre a possibilidade de haver mais de um sindicato de uma mesma categoria numa localidade. Segundo Marcus Orione, tal medida poderia enfraquecer as organizações e demandaria, sistemas de repressão penal mais fortes a crimes contra organizações de trabalho e a condutas anti-sindicais. Para o professor, com o aumento de importância da negociação proposto pelo projeto, seria necessária a exigência de transparência, principalmente quanto ao orçamento das empresas.
Na opinião de Orione, que também é juiz federal convocado, há necessidade de uma reforma no sistema sindical, mas não pelo modelo atualmente em discussão. Ele sugere que os sindicatos ampliem sua base de representação a ex-trabalhadores da categoria e até mesmo propõe o fim do conceito de categoria. Quanto ao papel da negociação ele afirma que é necessário “um mínimo de proteção legal porque não é possível deixar tudo num país como o nosso só para a relação direta entre capital e trabalho, tamanha a desigualdade até mesmo no campo coletivo”. O Estado precisa respeitar a liberdade sindical sem negligenciar a proteção ao trabalhador.