Após a resolução 586/13, do Conselho Federal de Farmácia (CFF), publicada no Diário Oficial em setembro do ano passado, farmacêuticos passaram a poder receitar medicamentos que são isentos de prescrição médica – os chamados de over-the-counter (OTC).
A partir disso, o Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP passou a oferecer um curso de difusão intitulado “As bases farmacológicas na prescrição farmacêutica”. O docente reponsável é Moacyr Luiz Aizenstein, do Departamento de Farmacologia do ICB, e o público alvo é composto por farmacêuticos que atuam em farmácias e drogarias.
“Muitos farmacêuticos que estão na profissão há um certo tempo já se esqueceram de muito do que aprenderam. As aulas seriam uma forma de atualizá-los”, afirmou Aizenstein. “A ideia é fornecer aos alunos conhecimentos sobre os mecanismos fisiológicos que cada indivíduo apresenta”.
O professor aponta uma deficiência dos cursos de graduação em Farmácia na área de fisiopatologia. “Às vezes, o farmacêutico prescreve um antiemético [medicamento para vômito] sem conhecer o que provoca o vômito” diz ele. Portanto, a ideia é apresentar aos alunos os mecanismos fisiológicos ligados a doenças menores, às quais se receita remédios isentos de prescrição. Outra das motivações está relacionada à perda de foco dos cursos de farmácia. “O curso é polivalente: forma profissionais para a área indústrial, de alimentos, de cosméticos, de análises clínicas, de controle de poluentes, dentre outras. O foco deveria ser em medicamentos”, diz ele.
Um dos diferenciais do curso oferecido pelo ICB está no fato de que ele visa individualizar os pacientes. “Quando se lança um medicamento, faz-se estudos clínicos. As respostas deles se apresentam na forma de uma curva de Gauss [ver imagem]” conta Aizenstein. “O medicamento é prescrito para o grupo central, que é a maioria. Os extremos, que não são poucos indivíduos, são geralmente ignorados. Então, quando se prescreve, em geral, não se individualiza, mas se massifica”, completa. O farmacêutico que passar pelo curso será instruído a fazer uma série de perguntas ao paciente, uma espécie de anamnese médica, para saber mais sobre o problema. A partir disto, ele avaliará se tem condições de receitar algo.
Resultados
Se obtiver sucesso, o curso poderá reduzir os problemas causados pela auto-medicação. “O farmacêutico que tiver as aulas fará uma “auto-medicação responsável”, receitando o medicamento mais adequado e, se não for necessário, nem mesmo medicar”.
A solução do problema, porém, vai além de investimentos na formação dos farmacêuticos. Ela envolve todo o sistema de saúde. “O paciente sabe que ficaria horas para ser atendido em um posto de saúde, então ele procura resolver os problemas sozinho. É preciso haver uma reestruturação da saúde no sentido de fornecer condições para o indivíduo ser clinicamente avaliado”, diz Aizenstein.
Pensando em medidas para diminuir o problema da automedicação, o professor ainda teceu críticas às propagandas de medicamentos, que, a seu ver, deveriam ser proibidas. “É necessário, também, transformar as farmácias, que hoje são estabelecimentos comerciais a priori, em estabelecimentos de saúde de fato”.
Imagens: Wikipedia