ISSN 2359-5191

07/05/2014 - Ano: 47 - Edição Nº: 9 - Saúde - Faculdade de Saúde Pública
Trotes universitários prejudicam entrada de futuros médicos no SUS
Para professor da FSP, prática reproduz lógica de exclusão e hierarquização dos profissionais da área
Trotes deveriam ser fiscalizados pelas diretorias, afirma professor da FSP

Humilhação, agressões físicas e psicológicas e, principalmente, submissão. Popularmente conhecidos pelos excessos e violência, os trotes universitários continuam a fazer novas vítimas ano após ano. Entretanto, mais do que apenas afetar diretamente os calouros, a prática pode provocar efeitos negativos mais amplos. Futuros profissionais de saúde, alunos de cursos como medicina, por exemplo, reproduzem no “ritual” uma lógica de hierarquização que vai na contramão das diretrizes do modelo de Saúde Pública brasileiro, o SUS (Sistema Único de Saúde).

“Se eu não consigo respeitar meu próprio colega, se eu não consigo tratá-lo como igual e considero que um calouro vale menos do que um veterano, como vou respeitar os outros profissionais, como psicólogos e enfermeiros?” afirma Marcos Akermam, professor da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP e autor do artigo Apelo aos Diretores de Instituições de Ensino Superior: por favor não se rendam a trote.

Vice-diretor da Faculdade de Medicina da UFABC (Universidade Federal do ABC) entre os anos de 2010 e 2014, Akerman relata que seu texto foi dirigido aos diretores das instituições de ensino superior por conta de sua própria experiência no cargo.

“Quando fui vice-diretor da UFABC criamos um movimento contra o trote que acabou inclusive com a expulsão de alguns alunos. Se as diretorias não tomarem para si esta prática, os próprios alunos veteranos se responsabilizam pela recepção dos calouros e excessos acabam sendo cometidos”, disse.

“Interprofissionalidade”

Em seu artigo, Akerman afirma que os piores trotes acontecem, via de regra, em cursos universitários ligados a profissões mais “tradicionais”, como medicina, direito, engenharia e agronomia. Nos casos de cursos médicos, o professor considera que a prática faz com que todos os esforços sobre a necessidades de equipes interprofissionais no SUS, que atuem de maneira colaborativa e horizontal, “caiam no vazio”.

“A interprofissionalidade é o coração do SUS e esta hierarquização, dos mais velhos contra os mais novos é extremamente prejudicial contra este modelo.”, afirma Akerman.

De acordo com o professor, a própria reprodução do trote pode desinteressar o atendimento de pessoas mais pobres pelos futuros médicos. “Se há uma hierarquização, é quase automático que os médicos passem a naturalizar o atendimento dos mais ricos em detrimento dos mais pobres. O trote reforça a lógica de exclusão”.

Espírito de corpo

Autor do livro que será lançado em breve Bulindo com a Universidade, onde o problema ocasionado pelos trotes será tratado com maior profundidade, Akerman afirma que, grande parte da responsabilidade pela violência dos trotes nas faculdades pode ser atribuída ao próprio espírito de corpo fomentado pelas diretorias das instituições.

“Os diretores valorizam este espírito, como uma espécie de sistema de defesa e barreira contra críticas à própria faculdade. Não pode sair nada de “ruim” dos muros das instituições”, afirma. Segundo Akerman, isto reforça a posição de poder dos alunos e professores, e isola os futuros médicos do restante dos profissionais da área da saúde.

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