O agronegócio é um assunto de grande importância a ser discutido em termos de economia e preservação ambiental, uma vez que controlando quase um terço do PIB nacional. O setor sucroalcooleiro, por exemplo, é um dos que mais movimenta capital e que mais se expande nos dias de hoje. Em seu estudo intitulado Efeito da expansão do cultivo de cana-de-açúcar na composição da paisagem do estado de São Paulo, a pesquisadora Thaís Nícia procura avaliar a pressão que o cultivo exerceu sobre a paisagem em que está inserido, e busca entender como sua expansão afetou a paisagem e a vida local.
“O que me motivou a trabalhar com esse tema foi a recente expansão do cultivo de cana-de-açúcar”, explica Thaís. A análise foi realizada a partir de um olhar aprofundado sobre o histórico de nove paisagens que passaram pela expansão do cultivo de cana durante o Proálcool (programa de substituição em larga escala dos combustíveis derivados de petróleo por álcool, financiado pelo governo a partir de 1975) e o mapeamento de quatro datas diferentes de 15 em 15 anos. “Além disso, trabalhei por quase dois anos no Laboratório de Ecologia e Restauração (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz - ESALQ) com adequação ambiental, principalmente de usinas de cana-de-açúcar”, acrescenta a pesquisadora, ressaltando seu contato prolongado com o ramo, o que favoreceu seu entendimento sobre o cultivo de cana e a chance deste apresentar uma tendência em ser ambientalmente adequado (respeitando as leis do Código Florestal).
A questão do etanol ser um “combustível verde” e “ambientalmente correto” é bastante debatida: embora pareça, a princípio, uma alternativa muito mais sustentável do que a gasolina comum, a expansão do setor sucroalcooleiro que ocorreu no passado causou grande desmatamento do campo cerrado e cerradão, o que gera enorme débito de carbono. A cana expandiu em todas as classes de uso do solo, não poupando áreas de cobertura natural, exceto em APPs (Áreas de Preservação Permanente), conforme analisado na pesquisa. “Em nenhum momento em que a cana foi a classe dominante da paisagem, a porcentagem de cobertura natural foi superior à 20%”, pontua Thaís. O cultivo de cana-de-açúcar ocorreu em todas as paisagens analisadas em desacordo com o Código Florestal vigente da época, de forma que se a nova expansão da cana ocorrer nos mesmos moldes que a expansão do Proálcool, o etanol não pode ser considerado um combustível “ecologicamente correto”.
O estudo aprofundado dos prós e contas do cultivo da cana-de-açúcar no estado de São Paulo nos mostra que, apesar de recentemente apresentar uma ligeira tendência de regeneração da vegetação em paisagens, está em desacordo com a quantidade de cobertura natural exigida por lei. A pesquisa indica que há um pequeno aumento de cobertura natural quando ações como essas são realizadas. Assim, o incentivo dessas práticas deve ser encorajado, principalmente em vista do novo Código Florestal, que obriga ações de restauração em APPs em áreas consolidadas. Dessa forma, é provável que essa melhora aconteça mediante uma maior fiscalização, ou pela implementação do Zoneamento Agroecológico do Estado ou pela certificação ambiental.
Segundo a pesquisadora, a análise aprofundada sobre a paisagem e seu dinamismo com a ação antrópica dos últimos anos permite um novo entendimento desses biomas diante do novo código florestal, além de continuar analisando a dinâmica à luz do mesmo. Dessa forma, futuramente será possível que outras pesquisas possam comprovar a eficácia das ações voltadas para o incremento de cobertura florestal nessas áreas.