“A minha posição é: o Brasil não precisa de reatores nucleares”. Dona de uma trajetória de pesquisa bastante variada, a professora do Instituto de Física (IF) da Universidade de São Paulo (USP), Emico Okuno, que possui livros publicados sobre a mecânica do futebol, física para biólogos e física das radiações, vem dando palestras pelo Brasil sobre o panorama da energia nuclear no mundo, alertando para seus problemas ainda sem solução. “É uma palestra por mês, no mínimo, sobre como que está a situação no mundo entre reatores em operação, reatores desativados, e o preço de energia elétrica gerada pela energia nuclear”, explicou.
Os defensores desse tipo de energia sofreram uma derrota com mais um acidente de proporções catastróficas, o de Fukushima, no Japão. De acordo com Emico, as usinas nucleares para produção de energia elétrica possuem dois problemas sem solução. “Os rejeitos usados continuam muito quentes e ninguém sabe onde colocar. Não tem depósito de rejeito permanente em lugar nenhum no mundo”, afirmou. As soluções encontradas pelos países são provisórias ou precárias, de acordo com a professora, que cita o caso da Finlândica, que financiou um projeto de alto custo para guardar os rejeitos de suas usinas por até 100 mil anos. “Mas qual a mensagem que você vai dexar escrito lá? Tem que deixar alguma coisa escrita”, questiona.
“Os Estados Unidos, por exemplo, fizeram um projeto para levar os rejeitos dos reatores americanos para o Deserto de Nevada. Transportando os rejeitos das 100 usinas nucleares, é uma Chernobyl ambulante”, disse.
Desta crise decorre outro problema sem solução, segundo Emico: o descomissionamento das usinas nucleares, que consiste no desmantelamento dos reatores. Sem projetos para depositar os rejeitos, as praças não podem ser devolvidas aos públicos devido à presença dos resíduos da produção de energia elétrica nos reatores. Construídos para durar 40 anos, os parques nucleares tiveram seu tempo de vida aumentado por mais 20 anos, mas seu período de atividade, em média, é de 26 anos, acelerando o processo de descomissionamento e, como consequência, a necessidade de armazenamento dos rejeitos. “O principal motivo é econômico, porque não vale a pena consertar se tá com problemas”, explicou Emico Okuno.
As dificuldades estruturais e o alto preço da energia elétrica produzida, além do recente acidente em Fukushima, forçou países como o Japão e Alemanha a abandonarem esse tipo de energia. A batalha que trava Emico Okuno, entretanto, é contra os defensores do uso de energia nuclear no Brasil. “Nós temos muito sol, nós temos muito vento, nós temos muita maré, tem hidroelétrica ainda para construir. Então, o Brasil não precisa de energia nuclear”, defendeu a pesquisadora, que ainda lembrou o interesse geopolítico que há na história da energia nuclear no Brasil. “Quando, no governo militar, quiseram construir sete reatores nucleares, os militares queriam bomba atômica, tanto que construíram na Serra do Cachimbo, no Pará, buracos imensos especiais para realizar testes”.
A professora, autora de um dos livros mais editados sobre física das radiações, no entanto, não descarta usinas nucleares como um todo. “Eu não sou contra reator nuclear para produção de radio-isótopos”, explicou Emico, “que são usados na medicina para diagnosticar doenças, salvar vidas”. Em relação à fusão nuclear, Emico Okuno afirma que ainda é uma perspectiva distante. “A fusão nuclear está enfrentando problemas muito complicados e espera-se que daqui a 40 anos, quem sabe, consigam produzir Tokamaks (o equivalente a reator nuclear, a máquina que gera energia elétrica) para produção de energia elétrica, mas é muito tempo”, concluiu.