ISSN 2359-5191

18/09/2014 - Ano: 47 - Edição Nº: 62 - Sociedade - Faculdade de Direito
Práticas homossexuais ainda são socialmente recriminadas e moralmente condenadas
Pesquisa estuda as decisões jurídicas sobre casamento e união estável à luz da teoria marxista de fetichismo da mercadoria
Foto: divulgação

Apesar das decisões judiciais recentes, como a Resolução nº 175/2013, aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça que dispõe sobre a habilitação, celebração de casamento civil, ou de conversão de união estável em casamento, entre pessoas de mesmo sexo, as práticas homossexuais, segundo o pesquisador William Glauber Teodoro Castanho, ainda são socialmente recriminadas e moralmente condenadas: “algo de novo, então, mantém-se velho nos acórdãos do STF e do STJ”. 

A Constituição Federal do Brasil (1988), com seus princípios idealistas de promoção, efetivação e proteção dos direitos humanos, estabelece que a família, como base da sociedade brasileira, “tem especial proteção do Estado” e reconhece a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar.  Assim, o homem e a mulher que de livre e espontânea vontade querem se receber como marido e mulher obtêm a tutela jurídica, podendo constituir uma família por meio do casamento civil (contrato formal) ou por meio da união estável (contrato tácito). 

No entanto, casais formados por pessoas que se atraem por outras do mesmo sexo, sentindo-se possuidoras dos mesmos direitos em relação aos seus desejos e vontades, procuraram, por meio da mobilização social e articulação política, apresentar suas demandas ao Poder Judiciário, tendo obtido, perante a lei, o direito de igualmente constituir uma família. Estas e outras questões contemporâneas da homossexualidade e suas relações com o Judiciário brasileiro são tratadas por William Glauber Teodoro Castanho, em sua dissertação de Mestrado apresentada e defendida na Faculdade de Direito da USP. Nela o pesquisador procura mostrar, à luz da teoria marxista do fetichismo da mercadoria, contradições e  paradoxos decorrentes das decisões jurídicas que, por exemplo, reconheceram a união estável homoafetiva e, ao mesmo tempo, estenderam à família homossexual o mesmo tratamento jurídico dado à união estável de casais heterossexuais em maio de 2011 e também vedaram aos cartorários recusar a celebração de casamento de pessoas do mesmo sexo ou a conversão de sua união estável em casamento civil há cerca de um ano.

Com tais conquistas na área jurídica, os casais homoafetivos garantiram por lei a igualdade formal e podem agora expressar e praticar publicamente aquilo que os deixou mais livres para uma nova forma de amar.  Exigiram e conquistaram o direito idealista de celebrar contratos, mas a mesma lógica do direito poderá, contraditoriamente, torná-los aprisionados das amarras do contrato formal do casamento civil: “venceram, mas perderão se não mantiverem postura crítica diante das armadilhas fetichistas do direito e das fórmulas jurídicas que elas expressam e materializam”.

Segundo afirma Castanho em sua dissertação, o movimento LGBT, nascido nos finais dos anos 1970 no Brasil, tem lutado, sobretudo após os anos 1990, não apenas por direitos humanos, mas principalmente pela emancipação e superação do fetichismo sobre seus desejos, suas práticas, seus corpos e seus sexos. É uma população radicalmente contrária às práticas e aos discursos do “sempre foi assim”. Esbarravam, porém, na lei, na tradição e, principalmente, na moral. 

A primeira barreira, pelo menos em parte, já foi removida. No entanto é preciso, após o reconhecimento da união estável homossexual ou do casamento civil LGBT, que os casais façam uma reflexão a respeito de suas conquistas para que possam visualizar outras demandas que lhes são negadas pelo direito, “relações livres, poliamor, concubinato, entre outras formas de expressão de amor”.

O direito vai lentamente “cedendo às pressões sociais e abarcando pressões pontuais da população LGBT para, paradoxalmente, fortalecer-se e se manter”. No entanto, o processo de transformação preconizado pelo movimento LGBT, na busca da plena libertação, ainda não chegou ao fim: para “meninas que amam e se atraem por meninas e meninos que amam e se atraem por meninos, a liberdade, como lembra Marx, ainda é uma promessa. (...) O processo é longo e penoso. Resta concluí-lo”, afirma Castanho.

Desse modo, o pesquisador alerta para a necessidade de se buscar na Constituição Federal uma igualdade “substancial” capaz de garantir a liberdade de todos e, após as conquistas efetivadas na área jurídica, mulheres e homens homossexuais precisam agora “desatar as amarras da forma jurídica e buscar erigir, para além do fetichismo da mercadoria e do fetichismo do direito, uma nova sociedade, na qual a liberdade é premissa, e não princípio, é meta exequível e executável”.

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