Os estudos de astronomia e a produção de romances de ficção científica possuem uma íntima relação, pois os principais escritores desse gênero sempre beberam das fontes de viagens espaciais, do mistério do universo e do desenvolvimento de fenômenos astronômicos. Tendo essa associação base como tema, o seminário ocorrido na 19ª Semana de Arte e Cultura do IAG, “Ficção Científica e Astronomia”, ministrado pela jornalista e mestre em literatura inglesa com ênfase em ficção científica e fantasia, Cláudia Fusco, buscou retomar essa ligação, demonstrando a história dela e, ao mesmo tempo, definir os parâmetros e as perspectivas dessa relação, que atualmente esta diminuída.
Para a simples definição de Ficção científica, Fusco parte da premissa de juntar três teorias: a “literatura racional”, a “aceitação de leis naturais” e “que seja baseada em história e ciência”. Assim, já a diferencia da fantasia, pois esta é mais irracional, conta com a presença de lendas e mitos, não aceita as leis naturais e possui uma gama maior de assuntos. Já ao comentar da astronomia, ela remonta aos tempos dos filósofos gregos que praticavam a ciência da observação e do experimento, como Pitágoras e Luciano de Samósata, e passa por outros nomes mais modernos, como Copérnico, Galileu e Giordano Bruno. Ao tentar vencer a ideia do céu inatingível, esses cientistas serviram de forte influência para a ficção científica que viria.
A utilização da astronomia para os romances do gênero ganhou bastante importância principalmente com o francês Júlio Verne e o britânico H.G. Wells, ambos do final do século XIX e começo do XX. Verne, segundo Fusco, ficou famoso por suas “viagens extraordinárias”, mais insólitas; já Wells ganhou status com seus “romances científicos”, com mais presença do rigor da ciência. Porém, foi o Hugo Gernsback - o mesmo do Prêmio Hugo de ciências - que juntou essas duas características e editou diversas obras de ficção científica.
A união da astronomia com os romances ficou mais evidente com a chamada “Era de ouro” da ficção científica, da qual faziam parte as obras dos autores Isaac Asimov, Ray Bradbury e Arthur C. Clarke. Essa “era de ouro” se desenvolveu também graças aos avanços da tecnologia que possibilitaram as famosas viagens espaciais dos anos 50 e 60 do século XX. Ou seja, segundo Fusco, tratava-se de “tempos otimistas”, nos quais era nítida essa relação com a astronomia. Foram essas obras que “moldaram o imaginário da ficção científica”.
Entretanto, após diversas vertentes diferentes, as viagens espaciais foram dando lugar a um novo modo de produzir ficção, com o surgimento da ciência do ser humano, no qual era latente o questionamento da validade dos seres humanos nesses avanços tecnológicos. Sai a astronomia, entra o homem e toda a sua complexidade inerente. Desaparece o otimismo e floresce uma época de pessimismo. O americano Philip K. Dick é um dos expoentes dessa nova época, na qual existe, para Fusco, uma “cultura pulverizada” da ficção científica. “Trata-se de uma nova fase, com uma nova forma de contar estória”, comenta.
Fato é que, após a popularização da ficção científica, os tempos são de crise para essa aliança com a astronomia. As obras de ficção científica não são mais tão focadas nesses temas. “Ela [a astronomia] ficou esquecida, apesar de pontualmente aparecer, é uma incógnita”, diz Fusco. Porém, ela se mantém otimista com relação ao tema, e comenta que é necessário um “reencatamento cognitivo” por parte dos novos escritores, pois já existe muito conhecimento acessível. Através de renovações e de um novo encantamento, as obras de ficção científica podem continuar a adentrar a famosa fronteira final, isto é, o espaço e seus mistérios.