ISSN 2359-5191

07/11/2014 - Ano: 47 - Edição Nº: 81 - Sociedade - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Ciclovias estão longe do trabalhador
Ex-funcionária da CET mostra que uso de bicicleta é maior na periferia e não por lazer
Vias se concentram em áreas mais ricas da cidade e não atendem a quem vem de longe. Foto: Wikimedia Commons

Apesar da prefeitura de São Paulo prometer implementar 400 quilômetros de ciclovias até o final de 2015, os espaços destinados à bicicleta na cidade ainda são “tímidos, isolados e desarticulados entre si”, segundo tese apresentada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. De acordo com a pesquisadora Maria Ermelina Malatesta, a localização das redes cicloviárias na capital paulista não corresponde às regiões onde se concentra a população que utiliza a bicicleta como principal meio de transporte.

Em “A bicicleta nas viagens cotidianas do Município de São Paulo”, Malatesta observou que o ciclista paulistano é majoritariamente homem, trabalhador, morador da periferia e vive com renda de até três salários mínimos. Para a pesquisadora, este público não pretere o transporte motorizado à bicicleta por razões culturais ou tendências ambientalistas, mas para depender menos ou suprir as carências do sistema de transporte público. Paralelamente, ela notou que o grupo responsável por “sensibilizar o poder público” quanto às vantagens do transporte cicloviário pertence a outro estrato social, morador dos bairros de classe média e alta no Centro Expandido da capital, atraindo as principais ações para essa região, onde há maior poderio econômico e visibilidade política.

Segurança acima de tudo

Malatesta iniciou a vida acadêmica tardiamente, após trabalhar por mais de três décadas para a Companhia de Engenharia e Tráfego (CET), onde participou dos primeiros projetos de ciclovias de São Paulo. Após realizar seu mestrado na área de segurança no trânsito, dedicou-se à mobilidade urbana cicloviária para o doutorado. Não abandona, porém, as bandeiras de educação em cidadania e conscientização de motoristas e ciclistas. “O motorista brasileiro é selvagem”, afirma, criticando os altos limites de velocidade nas principais vias de São Paulo e defendendo uma mudança cultural para integrar seguramente a bicicleta à metrópole.

Muitas dessas vias de alta velocidade, ela aponta, servem como única ligação entre o centro e as regiões periféricas da cidade, e nelas se registra as maiores densidades do uso de bicicleta (até 5 mil viagens diárias em algumas áreas). Com o tráfego intenso de motorizados, o veículo se torna uma opção mais rápida para o trajeto, porém mais perigosa.

Lazer ou alternativa?

Entre ações do poder público para expandir e estimular o transporte cicloviário em São Paulo - intensificadas a partir de 2013, sob gestão do prefeito Fernando Haddad - diferentes medidas são aplicadas para acostumar o paulistano ao pedal. É o caso das ciclofaixas de lazer, desenvolvidas em parceria com o setor privado, que “emprestam” 120 km de vias da cidade aos fins de semana para proporcionar lazer e educação de trânsito para os ciclistas. Malatesta aponta, porém, que essas iniciativas costumam ceder ao marketing das empresas patrocinadoras e se apropriar da postura cicloativista, concentrando-se em áreas de maior visibilidade e pouco alterando o caráter de São Paulo enquanto metrópole “estruturada para o automóvel”, como a pesquisadora define.

Embora os dados mais atualizados sobre o uso da bicicleta na capital paulista sejam de 2007, ano em que a última Pesquisa de Origem e Destino do Metrô (utilizada como base no trabalho de Malatesta) foi realizada, a acadêmica acredita que o próximo estudo, em 2017, seguirá mostrando a predominância do veículo nas regiões periféricas - e por viabilidade, não lazer. “Na periferia você vê que, ao invés de um, dois carros na garagem, cada membro da família tem sua bicicleta”, afirma. Mas, para que a rede cicloviária seja mais eficiente, ela defende que os ciclistas e cicloativistas não apenas briguem por seus direitos, mas cumpram os deveres enquanto cidadãos. E também que se supere o paradoxo socioeconômico que envolve os principais dependentes da bicicleta. “O trabalhador não tem tempo de reivindicar nada”, lembra.

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