O uso de atividades terapêuticas em clínicas psiquiátricas surgiu no século 20, o mesmo em que Sigmund Freud começou a difundir as teorias que fundaram a psicanálise. Entretanto, apesar de contemporâneas, essas duas vertentes terapêuticas pouco têm em comum: enquanto que a primeira se relaciona fortemente com o funcionalismo americano, com o consciente e com a ocupação de pacientes em diversos ofícios, a segunda tem como ponto de partida o inconsciente, e se dá através do ato da fala. Historicamente, no entanto, não demora muito tempo para que diversos pensadores comecem a misturar conceitos teóricos e práticos de ambos os métodos.
Em sua dissertação de mestrado, defendida no Instituto de Psicologia da USP (IP/USP), Maria Florencia Guglielmo procura explorar como se deram e como ainda se dão os estudos e as práticas que mesclam os conceitos da psicanálise com os da teoria ocupacional. Dentre eles, ela destaca a abordagem conhecida como "terapia ocupacional psicodinâmica", aquela que tem como base do tratamento os conceitos fundamentais da psicanálise. Segundo Florencia, essa vertente tem como ponto de partida a noção de que o ambiente tem grande influência sobre o desenvolvimento psíquico de um indivíduo. "Diante de casos mais graves, a técnica psicanalítica precisava sofrer modificações de maneira a adaptar-se às necessidades de alguns pacientes", conta a pesquisadora. Como tratar daqueles que não respondem à psicanálise "clássica", cujo tratamento se dá verbalmente? De acordo com a pesquisa, uma das saídas é o empréstimo das práticas que se utililzam de mediação, como a terapia ocupacional.
René Roussillon e Anne Brun, psicanalistas e professores da Université Lumière Lyon 2, desenvolvem atualmente estudos acerca dessa mescla. "Suas pesquisas atualmente se ocupam do estudo das práticas terapêuticas de mediação, como pintura, modelagem, contação de histórias", conta Florencia, "principalmente nas psicoterapias psicanalíticas de crianças e de pacientes psicóticos". Para embasar seus estudos, os pesquisadores franceses se utilizam de um conceito que a brasileira também usa em sua dissertação: a de "meio maleável", introduzia pela inglesa Marion Milner. Além de psicanalista, Milner era pintora, e acreditava que a arte, através da expressão do indivíduo em um material, criava uma ponte entre o interno e o externo de efeitos terapêuticos.