São Paulo (AUN - USP) - Durante três dias, os alunos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAU) suspenderam suas aulas e passaram 72 horas discutindo a função da faculdade na cidade. O evento, organizado pelo grêmio da instituição, com o apoio da secretaria de graduação, foi batizado de “charrete de ensino”.
O nome foi escolhido em referência a atividades realizadas pelas escolas de belas artes francesas séculos atrás, quando os alunos eram “presos” nos estúdios por dois ou três dias. Durante esse período, eles deveriam fazer e apresentar projetos práticos. Charretes circulavam pelos estúdios distribuindo alimentos aos alunos e, no fim do tempo determinado, voltavam para recolher os trabalhos finalizados.
“Fizemos uso do termo para nos referir a outros projetos que queríamos propor: o de discussão do papel da universidade, mais especificamente da faculdade de Arquitetura, na construção da cidade”, explica Paulo Miyada, um dos diretores do grêmio da FAU.
Para ele, a faculdade carece de espaços de reflexão do próprio curso. Outras atividades feitas em outros anos com esse propósito, como oficinas e grupos de debate curriculares, acabavam se tornando, segundo ele, “assembléias”, em que apenas ocorriam discussões teóricas, com poucos resultados práticos. A “charrete de ensino”, em que os alunos passaram três dias apenas discutindo o assunto, teria como meta chegar a resultados mais práticos.
Miyada afirma que a intenção do projeto não era chegar a reformas pontuais no currículo (como criar ou extinguir alguma disciplina), mas criar uma “cultura de debate” dentro da FAU. Antes dos três dias de “confinamento”, grupos de discussão e outras atividades incitavam os alunos a pensar sobre essas questões. Na charrete, essas discussões culminariam em proposições.
Como exemplo de proposta, Miyada cita a do seu grupo de discussão, que sugeriu a criação de um estúdio público de arquitetura. O espaço, projetado para ser construído no centro da cidade –já que a universidade está inclusive fisicamente distante da realidade urbana- reuniria estudantes de Arquitetura que fariam projetos práticos para os escritórios da prefeitura, como Emurb.
Para o curso de Arquitetura, a vantagem principal seria ter problemas concretos à sua disposição, no lugar das proposições teóricas utilizadas nas aulas, atualmente. Já a prefeitura ganharia o conhecimento acadêmico produzido pela universidade.
O projeto proposto pelo grupo de Miyada é um exemplo do que ocorreu durante os três dias da “charrete de ensino”, mas não foi a única atividade. Outro grupo, para pensar no papel da universidade dentro do espaço urbano, decidiu “passear” pelo centro da cidade de São Paulo e visitar bairros históricos, como símbolo da “saída” da universidade de seu confinamento, que queriam propor. Houve ainda um grupo que sugeriu a criação de uma universidade subterrânea.
Apesar de não serem propostas finais, as atividades desenvolvidas durante os dias 18 e 21 de outubro representam a necessidade de os alunos de repensar sua função diante de tantos problemas por que passa a cidade e que, muitas vezes, passam desapercebidos pelos olhos da universidade. “Aqui dentro, muitas vezes, nós fragmentamos os objetos de estudo, mas a realidade é outra, mais complexa. Devemos discutir maneiras de abordarmos mais de perto esses problemas”, diz Miyada.