São Paulo (AUN - USP) - Os pesquisadores das áreas médicas e biomédicas estão entre os que apresentam resistência à lei que versa sobre o uso de animais na experimentação científica e na didática. A lei em questão, que engloba o Código Estadual de Proteção aos Animais, proposta pelo deputado Ricardo Trípoli (PSDB) e aprovada recentemente pela Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. Ela também encontrou resistência em outras esferas da sociedade. Comerciantes, pecuaristas, peões e até mesmo o Governador do Estado, Geraldo Alckmin, apresentaram várias Ações Diretas de Inconstitucionalidade.
Além disso, a professora do departamento de Farmacologia do Instituto de Ciências Biomédicas e coordenadora da Comissão de Biotérios, Zuleica Bruno Fortes, cita outros problemas, como os artigos que tratam sobre os membros que compõem as Comissões de Ética, a restrição à compra de animais para experimentação, a proibição da experimentação que cause dor, estresse ou desconforto no animal, além da escusa de consciência, que interfere na autonomia didática da Universidade.
Assim, de acordo com a docente, em vários pontos são encontradas inconstitucionalidades, ou artigos que contradizem a Constituição Federal. Entretanto, Zuleica afirma que não é contra a lei inteira. “Ela é necessária. Só não concordo com alguns artigos”.
Antes de a Lei ser aprovada, o ICB encaminhou um documento para o deputado Ricardo Trípoli pedindo a reformulação da mesma. Agora que a lei está em vigor, um grupo que engloba a USP, a Unicamp e a Unesp, além de outras Instituições, pede a modificação dos artigos problemáticos. O próprio Trípoli entrou com um Projeto de Lei, para modificar a Lei vigente. A docente afirma que também esse projeto não reformulará os artigos de acordo com o pedido do grupo.
O principal argumento que os pesquisadores têm a favor do uso de animais de experimentação é o avanço das ciências médicas. O professor Wothan Tavares de Lima, vice-presidente da Comissão de Ética do ICB, ressalta a importância de estudos realizados em animais de experimentação. “Nenhum estudo in vitro ou com robôs substitui completamente o estudo in vivo. O ser humano não é uma parte isolada, é um conjunto. Assim, qualquer pesquisa que será feita, tem que ser testada em um modelo que represente esse conjunto, portanto um modelo experimental”.
Além disso, pode-se pensar em todos os avanços da ciência que foram obtidos com estudos realizados em animais. Sem eles, não haveria como provar a eficiência das descobertas científicas, pois a questão ética em torno de cobaias humanas é muito maior. “E como ficaria a biomedicina? Estagnada até que se desenvolvessem – se é que isso é capaz – robôs que representassem um modelo satisfatório de seres vivos”.
Com esse argumento, os pesquisadores não descartam a ética no manuseio de animais de experimentação. O professor Wothan explica que há a consciência de que os animais têm sentimentos, então os pesquisadores terão o maior cuidado possível para que eles não sofram mais do que o necessário. O docente exemplifica da seguinte forma: “se o pesquisador precisa que o animal fique com dor por dez minutos para que ele obtenha os dados necessários para seu estudo, ele não vai deixá-lo por trinta minutos sob efeito de estímulo doloroso”.
Outro fator que entra na ética do uso de animais de experimentação é o cuidado que se tem para deixá-los em condições adequadas – ambientais e de saúde. Isso é importante tanto para o animal quanto para os resultados obtidos com a sua utilização, de maneira que se reduza o número de animais usados como modelos.
No dia 26 de outubro, foi ministrado um curso de Treinamento no Uso de Animais de Experimentação, organizado pela Comissão de Ética e pela Comissão de Biotério. O curso foi voltado para os alunos de graduação (iniciação científica) e pós-graduação e para os professores dos departamentos do ICB. Os tópicos foram: “Manuseio de Animais”, explicado pela biomédica Thais Marques e “Ética e Uso de Animais”, com o professor Wothan Tavares de Lima. No dia 04 de novembro o curso será ministrado novamente.
Esse curso foi o primeiro que englobou todos os departamentos do Instituto. Ao lado disso, cada departamento organiza cursos para menor número de pessoas e mais específicos também.
Os organizadores pretendem fazer uma edição do curso de treinamento para os alunos de todos os departamentos a cada semestre e organizar cursos de mais longa duração semestralmente no Instituto para os funcionários. No momento, os funcionários do Instituto estão freqüentando um curso mais longo, ministrado pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas.