ISSN 2359-5191

14/04/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 20 - Saúde - Faculdade de Saúde Pública
Políticas públicas para a prevenção do HIV não dialogam com jovens gays
Público tem conhecimento adequado da doença, mas a aids não é tratada com preocupação
Campanha do Ministério da Saúde para o carnaval

As políticas públicas atuais, como as campanhas de prevenção, não têm feito com que os jovens gays enxerguem o potencial devastador do vírus: o apelo negativo da ameaça de morte, muito forte quando a doença foi descoberta, não é mais frequente. Essa é uma das conclusões do estudo de Renato Santos da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, conduzido sobre as relações afetivas pós-diagnóstico nessa parcela da população.
O objetivo da pesquisa “Na escuridão do arco íris: A vivência das relações afetivo sexuais de jovens gays após o diagnóstico de HIV” era fazer um levantamento qualitativo que explicasse o porquê de certas constatações já estabelecidas no mundo científico, como a baixa adesão ao preservativo e à medicação, mesmo após o diagnóstico. Para isso, foram entrevistados dez homens homossexuais de 18 a 24 anos, que vivem com o vírus e que tivessem descoberto que são soropositivos a pelo menos um ano. Todos os participantes faziam tratamento no Instituto de Infectologia Emílio Ribas.


Segundo Renato, esse grupo possui conhecimento adequado da realidade da enfermidade, como o contágio ocorre e o que fazer para se proteger, mas, mesmo assim, não se previne, porque não enxerga a gravidade da situação. “A concepção hoje em dia é que uma doença crônica, com medicação, e que não mata mais”, explica o pesquisador, “Todos os meninos entrevistados disseram que, se tivessem medo de pegar HIV, teriam se protegido”. Alguns compararam a aids a uma gripe, dimensionando o que estes jovens pensam a respeito da condição, que ainda apresenta uma alta taxa de mortalidade apesar do tratamentos.
Além disso, existe o estigma de que soropositivos são pessoas de menor escolaridade, de menor nível social, portanto, caso o parceiro não se encaixe nesse padrão, não levantaria suspeita de ser portador. Há ainda uma relação entre a aids e a questão física: “Eles acham que todo cara que tem HIV, vai estar com a figura física do Cazuza”. Frequentadores de academia, por exemplo, não teriam o vírus.

Camisinha

A pesquisa aponta conjuntamente que grande parte das pessoas vivendo com HIV não passam a utilizar camisinha em relações casuais depois da descoberta, pois eles acreditam que está a cargo do outro se proteger. Assim, o contágio não seria responsabilidade só daquele que transmite, mas também do que estava ciente dos riscos e não tomou as precauções.
Esse tipo de atitude não tem nenhuma relação com o dito “Clube do Carimbo”, no qual os indivíduos buscam contaminar propositalmente seus parceiros, ou da prática do bareback, na qual existe um prazer relacionado com o risco de não usar preservativo. Nos casos constatados na pesquisa, a questão gira em torno do dever do outro em proteger-se, o que é muito diferente. “Eles pensam assim ‘se você pedir, eu vou usar [camisinha], mas se não, não’”, aponta o pesquisador, “Essa grande taxa de HIV acontece em parte porque alguns deles se abstêm dessa responsabilidade”.
Existe também o receio de revelar a condição de portador e perder a oportunidade de ter a relação sexual, ou, pior ainda, de ser hostilizado. Embora o temor de revelar a condição persista devido ao preconceito, foi observada uma tendência maior em utilizar preservativos com parceiros fixos, alguém com quem se pretende ter uma relação ou uma amizade, já que existe uma preocupação em manter esse vínculo.

Tratamento

Segundo a pesquisa, muitos destes jovens homossexuais não aderem à medicação devido à dois grandes fatores: o primeiro deles é o risco de que outros descubram através dos possíveis efeitos colaterais – enjôos, vômitos, entre outros – ou que desconfiem do hábito diário de tomar os remédios. O preconceito ainda é grande, mesmo dentro da comunidade gay.
O segundo motivo está novamente ligado à questão estética: os remédios pra HIV, e até mesmo a própria ação do vírus no organismo podem provocar alterações corporais, como a lipodistrofia, que é o acúmulo de gordura em determinadas partes do corpo. “Tratamento, na cabeça deles, não passa pelo remédio. O coquetel é um ‘extra’, o que ajudaria mesmo seria alimentação correta e academia”, explica o pesquisador.

Campanha do Ministério da Saúde

Políticas públicas

"Temos um governo que faz campanhas sem entender essas questões”, diz Renato. As ações são focadas para pessoas que ainda não possuem HIV, mas é necessário que haja também uma conscientização daqueles que podem transmitir a doença. Segundo o pesquisador, é preciso também que se encontre uma nova abordagem para lidar com quem não tem o vírus: “Se a pessoa não teve sexo seguro porque não tem medo, porque HIV tem remédio, ficar segurando cartaz escrito ‘use camisinha’ não está dando certo”.

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