O ICB5, centro de apoio do Instituto de Ciências Biomédicas da USP em Rondônia, estuda desde 2013 o envelhecimento da população local. Situado no município de Monte Negro, no meio da Floresta Amazônica, o ICB5 averiguou que as doenças mais comuns entre os habitantes idosos da região não são mais as parasitárias.
O estudo, comandado pelo professor Luís Marcelo Aranha Camargo, reuniu cerca de 400 idosos com mais de 60 anos. “O número é alto, já que a cidade possui 15 mil habitantes”, afirma Aranha.
Origem dos habitantes
Ao contrário do que se possa imaginar, a maior parte da população de Monte Negro não nasceu na região da Amazônia. Como resultado da política de oferecimento de terras, feita pelo governo militar no início da década de 70, 48% desses idosos vieram na época do Sul e Sudeste do país, notadamente de Minas Gerais, Espírito Santo e Paraná. Somente 3% dos habitantes do município são autóctones.
Esse dado é importante porque indica que se tratam de pessoas predominantemente brancas e estranhas àquele ambiente, ou seja, que possuíam pouca resistência às doenças da região e ao clima.
“Aparece uma pessoa com câncer de pele por semana no ambulatório da USP em Monte Negro”, diz Aranha, pontuando como o sol forte prejudica a saúde da população local.
Óbitos
A equipe que realizou a pesquisa reuniu também todas as certidões de óbito do município entre 2002 e 2011, por volta de 400. Mais da metade das mortes ocorreu por conta das chamadas DCNT (doenças crônicas não transmissíveis, como câncer, problemas cardiovasculares, derrames e doenças pulmonares oriundas do tabagismo). Cerca de 30% das mortes foram de origem violenta, sobretudo acidentes de moto. Causas ignoradas ou desconhecidas, fruto da falta de estrutura e de exames, somam 18%. O resultado mais surpreendente é que apenas 2% das mortes de Monte Negro foram causadas por doenças parasitárias, quadro muito diferente do que havia décadas atrás.
Nos anos 90, Rondônia apresentava metade dos casos de malária do Brasil: 300 mil por ano. Hoje em dia, com a diminuição considerável do garimpo e da derrubada de árvores, esse número é dez vezes menor.
Qualidade de vida
Por falta de pesquisas na área, o ICB5 não tem como comparar seus números com o de outras localidades da Amazônia. Dados do instituto mostram que 65% da população de Monte Negro morre com mais de 50 anos, enquanto 8% morre antes de completar um ano de idade. Já na cidade de São Paulo, por exemplo, o quadro é de 75% e 2%, respectivamente. Expectativa de vida maior e mortalidade infantil mais baixa são claros indicadores de que uma população vive melhor.
O estudo identificou que 70% dos idosos têm hipertensão arterial. A dislipidemia (altas taxas de gordura no sangue) atinge 65% deles. Já a diabetes mellitus tipo 2 afeta cerca de 20%. Os problemas oftalmológicos, como catarata e glaucoma, representam outro quadro preocupante. Uma parcela grande dos habitantes não recebe os tratamentos adequados para tais enfermidades.
O ICB5 continuará o acompanhamento dos idosos de Monte Negro por mais sete anos e meio, totalizando uma década de pesquisa. Segundo Aranha, é preciso investigar se existe uma relação entre as doenças infectoparasitárias e as DCNT. “Queremos entender se as doenças parasitárias interferem no envelhecimento dessa população”, conclui.