O Instituto de Ciências Biomédicas da USP (ICB) pesquisa desde 2009 a mansonelose, doença causada pelo verme nematoide Mansonella ozzardi. Conduzida pelo centro do ICB que se localiza na Amazônia, a pesquisa busca entender melhor a doença e atualmente testa o efeito de um medicamento em pacientes diagnosticados com o verme.
A doença
A mansonelose é transmitida através do mosquito borrachudo (ou “pium”). Dados apontam que em diferentes pontos da Floresta Amazônica, até 60% de uma comunidade pode ter a doença. O borrachudo é comumente encontrado próximo a córregos e rios, o que representa um risco a populações ribeirinhas.
“Alguns pesquisadores, como o professor Rubens Belfort, da Unifesp, acreditam que a mansonelose pode causar problemas nos olhos, inclusive a cegueira”, diz o professor Luís Marcelo Aranha Camargo, que encabeça o estudo do ICB5 (centro de apoio do ICB localizado na Floresta Amazônica, em Rondônia). A Mansonella ozzardi é “parente” de outro verme também transmitido pelo borrachudo, o Onchocerca volvulus, que leva à cegueira. No entanto, na mansonelose esse efeito ainda é incerto.
Pesquisa in loco
O estudo utilizou um método moderno de diagnóstico chamado PCR, que foi desenvolvido pela pesquisadora Janaína Vera. Ele é capaz de identificar quantidades muito baixas do verme na corrente sanguínea e por isso é extremamente eficaz para detectar se o paciente tem ou não a mansonelose.
A equipe atuou no município de Lábrea, no sul do Estado do Amazonas, e testou pessoas da região avaliada. No total, 74 foram diagnosticadas com o verme e se voluntariaram a participar do estudo. Após o tratamento com ivermectina–remédio comum para outras filarioses–, 53 continuaram por mais um ano.
A pesquisa corresponde a um ensaio clínico fase II, em que há o teste do medicamento em algumas dezenas de pessoas que possuem a doença e a análise dos resultados. Na pesquisa do ICB5, organizada pelo doutorando Sérgio Basano, não houve mortes nem efeitos colaterais para os participantes.
Três dias após a droga ser usada, 80% dos pacientes apresentaram melhoras dos sintomas (sinais genéricos como febre, dor nas juntas e coceira). A ivermectina foi eficiente em incríveis 100% dos casos e manteve os pacientes sem parasito durante um ano– período de tempo em que foram monitorados. Nessa etapa, a técnica utilizada para detectar a M. ozzardi no organismo foi a tradicional, chamada membrana de policarbonato. O sangue é diluído em soro fisiológico e depois passa por um filtro minúsculo. O verme é grande o suficiente para não atravessar o filtro e pode ser visualizado por meio de microscópio.
Todo o estudo foi financiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
Perspectivas
“Em julho faremos uma expedição de dez dias, de 100 a 150 quilômetros pelo rio Purus [na Amazônia], em que vamos cadastrar a população, visando preparar o ensaio clínico fase III”, revela Aranha. Segundo ele, a mansonelose é “negligenciada” pelas autoridades públicas.
Na localidade em que a viagem se concentrará, cerca de 30% a 50% da população tem a doença. A busca por um medicamento eficaz prossegue. O processo pode parecer lento, mas até agora os resultados foram animadores.