Pacientes que sofrem de um AVC (Acidente Vascular Cerebral) em geral apresentam sequelas físicas e neuropsicológicas. A cognição - que corresponde a todas as tarefas realizadas a partir de uma atividade cerebral, como a atenção, a memória, a linguagem e a função executiva - é uma das principais afetadas por esse acidente. Como forma de facilitar a avaliação cognitiva dessas pessoas, Alessandra Baccaro, em sua dissertação de Mestrado realizada pela Faculdade de Medicina da USP, traduziu e validou a versão em português um questionário utilizado pelos profissionais da saúde para avaliação inicial por telefone
Alessandra é psicóloga e acompanha pacientes com AVC no Hospital Universitário (HU) da USP há 9 anos. Ela conta que, desde então, conseguiu levantar várias informações a respeito de como é a recuperação desses pacientes, qual foi o tipo de acidente e sobre o nível de prejuízo cognitivo deles. A partir desses dados, a pesquisadora passou a ter um maior panorama da doença, de forma que o seu tratamento pudesse se tornar mais eficiente, assim como a sua prevenção.
Por se tratar de uma doença que causa sequelas físicas e neuropsicológicas, a locomoção dos pacientes até o hospital pode ser bem complicada. Pensando nessa dificuldade física e muitas vezes financeira (sempre há custos para se locomover até o hospital), Alessandra propôs a aplicação de um questionário para a avaliação cognitiva pelo telefone, a TICS-M (Telephone Interview Cognitive State-Modified) traduzida para o português. “Esse questionário já tinha sido validado em alguns países da Europa, nos EUA e na Ásia. O nosso trabalho foi valida-lo e adapta-lo ao Brasil” relata a psicóloga. Ela alerta também para o fato de que tratar do grau de prejuízo da cognição é algo muito interessante, porque a elaboração de um tratamento direcionado pode favorecer um paciente na recuperação de algumas tarefas cognitivas pós-AVC.
Alessandra explica que essa avaliação consiste em indicar se a pessoa com AVC tem sinais ou traços de prejuízo cognitivo através de uma entrevista telefônica. São feitas perguntas bem gerais para testar a memória, a atenção, a capacidade de cálculo e a linguagem. Todo o processo dura cerca de cinco minutos e é feito totalmente pelo telefone, o que para Alessandra é uma ferramenta muito útil, pois possibilita a avaliação a distância.
Para comprovar a eficácia dessa escala de avaliação, Alessandra convocou 61 pacientes do HU que sofreram um AVC e são participantes do EMMA (Estudo de Mortalidade e Morbidade do AVC). Esses voluntários foram submetidos a uma série de exames neuropsicológicos e avaliações presenciais com instrumentos que já apresentam credibilidade, incluindo o novo questionário de avaliação cognitiva (TICS-M). O processo de validação do TICSM consistiu num processo de uso repetido do instrumento num prazo de 7 e 14 dias após a primeira aplicação. Além disso, esse novo questionário foi comparado a outros instrumentos já conhecidos e utilizados no Brasil para avaliar a cognição.
A partir de uma análise estatística, os resultados finais da versão brasileira da TICS-M mostraram que esse instrumento é eficaz, confiável e reprodutível em pacientes com AVC. A psicóloga conta, que desde então, esse questionário tem sido usado na avaliação de todos os pacientes com AVC que estão no seguimento no EMMA do HU. Ela acrescenta ainda dizendo que “estamos falando no caso do AVC, mas também podemos utiliza-lo em todos os quadros de doenças que apresentam questões de prejuízos cognitivos”.