A prática do consumo consciente – comprar e consumir levando em consideração o impacto que esse consumo tem na sociedade e na natureza – foi objeto de estudo da dissertação de mestrado da pesquisadora Monica Sabino Hasner, orientada pelo professor Edson Crescitelli. Um grupo de 172 cidadãos paulistanos participou de pesquisa a respeito de suas práticas e preocupações em relação ao tema da dissertação, defendida na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEAUSP).
O ato de consumir se encontra em uma área em que o consumidor tem um papel essencial, não só pela quantidade do produto que é comprado, mas também pela escolha sobre o que é, de fato, consumido. Há cinco anos, o brasileiro era mais engajado nessa atividade. Mônica credita essa distração nos últimos anos ao aumento do dinheiro no bolso das pessoas após a década de 90, quando a inflação era marcante e atingia altos índices. Com mais dinheiro no bolso, os indivíduos passaram a gastar mais, sem dar prioridade à prática consciente.
Segundo a pesquisadora, o consumidor pratica o consumo de maneira consciente quando ele ganha algum benefício financeiro em troca. Entre as práticas mais comuns, destacam-se: apagar a luz quando não há ninguém em um cômodo e fechar a torneira. Essas duas práticas, por exemplo, trazem reflexo direto no bolso do consumidor. “Se economizo energia elétrica, posso trazer benefício para a sociedade. Porém, também economizo”, afirma Hasner.
No entanto, se a prática é um pouco mais elaborada – exigindo mais esforço do consumidor – há a tendência do indivíduo não se engajar, caso ele não seja incentivado financeiramente. Comprar um produto reciclável, por exemplo, não é uma prática rotineira, assim como buscar produtos que são feitos de uma maneira mais sustentável. O consumidor não adere a essas atividades por não haver um reflexo – a curto prazo – em seu bolso.
As principais práticas do consumidor paulistano são: apagar as lâmpadas em ambientes não ocupados (93%), fechar a torneira enquanto escovar os dentes (84%), utilizar o verso da folha de papel quando possível (82%). Por outro lado, a compra de produtos orgânicos (27%) e compra de produtos que foram feitos ou embalados com materiais recicláveis (33%) são pouco praticadas. “Há uma queda dramática, e o cidadão não vê esse reflexo. No fundo, acaba pagando mais por isso”, completa Monica.
Em relação às preocupações, aquelas que afetam diretamente a vida do cidadão foram as mais lembradas, como a ausência de boas alternativas de transporte, a poluição, o fechamento da torneira enquanto a pessoa escova os dentes e a remuneração justa da pessoa que trabalha em sua residência. Verificar o material da embalagem de um produto, saber como a cidade de São Paulo resgata os resíduos de esgoto e gasta o mínimo de energia elétrica estão entre as menores preocupações.
Monica afirma que, quando o benefício é enxergado pelo indivíduo, o esforço pela prática consciente pode acabar. “Quando penso só em mim mesmo, o esforço é menor. Se quero ajudar a sociedade ou o meio ambiente, já preciso me esforçar um pouco mais, mas o benefício é maior. Agora, se quero fazer as melhores escolhas para a sociedade e a natureza, preciso me esforçar mais, mas o benefício é ainda maior”, afirma a pesquisadora.
O que as empresas podem fazer?
Embora algumas empresas já tenham despertado para esses números, muitas ainda nem pensam nisso. Como fazer o consumidor entender que ele pode ajudar a Amazônia a se manter caso ele esteja em São Paulo? A resposta, segundo Monica, é mostrá-lo que, através de melhores escolhas na hora de consumir, ele pode ser beneficiado e, ao mesmo tempo, colaborar com a sociedade.
O objetivo de uma empresa de cremes dentais, por exemplo, não pode ser voltado ao maior consumo do produto pelo consumidor. O correto, nesse caso, seria mostrar como é possível consumir esse produto da melhor maneira: mostrar o quanto ele deve usar, usar até o final da embalagem, verificar se uma determinada matéria-prima é melhor do que a outra. “Nos últimos anos, algumas embalagens foram reduzidas, porque o seu tamanho era excessivo”.
Para atrair o consumidor, as empresas podem se utilizar de programas de lealdade, incentivando o consumidor para que, conforme suas práticas conscientes aumentem, haja um benefício no bolso.
Ao mesmo tempo, Monica afirma que é necessário todo um ciclo da educação. “Como eu consigo ensinar o consumidor a ter melhores práticas? Como consigo ensinar o consumidor sobre quais são as melhores matérias-primas? “
Com os recursos tecnológicos atuais, o próprio consumidor é capaz de divulgar essas informações, através do Facebook, o Youtube. “Várias marcas já usam o próprio consumidor para dizer ‘olha, assim que eu economizo água na minha casa”.
Uma educação não vem nas últimas páginas de um manual com letras pequenas. É preciso achar como educar o consumidor de uma maneira a ter real contato com essas informações.
Se a empresa tem um certo posicionamento, ela tenta convencer de que essa postura traz alguma vantagem. À medida que o consumo consciente é reforçado, o próprio posicionamento pode incorporar essas coisas.
Há, no entanto, um problema. “Às vezes, a empresa até tem uma melhor solução, mas, se a solução não casa com os hábitos do consumidor e os concorrentes continuam entregando a solução antiga, ela não muda”, afirma Monica, que completa com uma possível saída: “Em alguns casos, nas instituições onde estão todos os concorrentes, já são acertados todos os movimentos que a indústria vai fazendo como um todo.
A criação de um novo hábito
À medida que um produto melhor está sendo colocado no mercado, o consumidor vai se adaptando. Esses novos hábitos não podem ir para uma direção em que o consumidor compre algo que o prejudique. “Se as empresas recompensarem um bom hábito, isso certamente traz retorno.”
E quando a solução é outra: a empresa traz um prejuízo financeiro para o consumidor que possui uma má prática?
Monica diz que não tem condições de julgar plenamente a decisão de algumas redes de supermercados: “Vejo da seguinte forma: não incentivo a punição, mas acho que se você ‘puxar a orelha do consumidor’ em alguns casos, talvez o aprendizado aconteça de maneira mais eficaz”, afirma a pesquisadora, que destaca que é a segunda vez que se tenta fazer essa mudança, que tem sido um grande “vai e volta”.
Uma influência ainda maior para a prática consciente é a existência de escolas que educam as crianças em relação à sustentabilidade. “Tenho duas filhas, de 15 e 17 anos, e elas têm excelentes hábitos: cada uma tem uma canequinha com identificação, e elas são usadas o maior número de vezes possível, para evitar que a louça seja lavada em excesso. À medida que as pessoas vão ficando mais maduras, Monica acredita que elas devem ser cobradas de uma maneira mais eficiente: “Minhas filhas aprendem o que não aprendi na escola”.