Uma linha de pesquisa do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB), liderada pela professora Alice Cristina Rodrigues, investiga como moléculas chamadas microRNAs atuam no desenvolvimento do diabetes mellitus.
“A ideia de que os microRNAs podem ser utilizados como marcadores precoces do aparecimento do diabetes e como alvos farmacológicos na terapia foi o que nos atraiu para estudá-los”, diz Rodrigues. A equipe investiga quais microRNAs regulam os genes no aparecimento do diabetes e se eles sinalizam seu surgimento e progressão, visando uma alternativa de tratamento.
MicroRNAs
O DNA de um indivíduo contém informações que devem ser convertidas em funções celulares. Para isso, é preciso que os genes sejam transcritos em RNA, que pode ser traduzido em proteínas. Os microRNAs são pequenas moléculas não codificantes de RNA que atuam na regulação da expressão gênica, ou seja, na síntese de proteínas. Eles se ligam a regiões de um RNAm (RNA mensageiro, parte que é codificante), interrompendo o processo. “Os microRNAs são moléculas abundantes nas células, e estima-se que 30% de todos os RNAm sejam regulados por microRNAs”, afirma Rodrigues.
Eles foram descobertos em 1993 pelo grupo do americano Victor Ambros, novidade que alterou os estudos na área. Segundo a professora, rapidamente os microRNAs se tornaram moléculas-alvo importantes para diagnosticar e tratar várias doenças. “Isso ocorre pois a expressão ou níveis desses microRNAs se mostraram alterados em diversas doenças, entre elas podemos citar o diabetes, a obesidade, o câncer, doenças cardiovasculares”.
Para elucidar o papel de um tipo de microRNA nas disfunções causadas pelo diabetes, a equipe analisa a superexpressão ou subexpressão da molécula, seja in vitro (cultura de células) ou in vivo (em animais). “Por exemplo, imagine que o microRNA miR-X tem níveis muito elevados no fígado de animais obesos com diabetes quando comparamos com animais normais. Podemos inibir esse microRNA no fígado através de anti-microRNAs e verificar se a ausência do microRNA protegeria o animal de ter diabetes”, explica a professora.
A biogênese do microRNA (miRNA) em células humanas: o miRNA precursor (pré-miRNA) é gerado no núcleo da célula e exportado para o citoplasma pela Exportina-5 (Expo-5) e clivado pela Dicer, uma enzima que degrada RNA, para gerar duplexes de RNA de aproximadamente 22 nucleotídeos (miRNA/miRNA). Uma fita do duplex (miRNA) é transferido para o complexo Agonauta (Ago) e guiada para parear com o RNAm alvo através da sua seed sequence (região de reconhecimento do miRNA).
A doença
O diabetes mellitus consiste numa série de disfunções metabólicas que se caracteriza pela hiperglicemia (excesso de açúcar presente no sangue) e por deficiência na produção ou atuação da insulina, hormônio que promove a entrada da glicose nas células. Aproximadamente 380 milhões de pessoas no mundo inteiro são diabéticas e esse número continua crescendo. A doença pode causar complicações renais, na visão, na cicatrização de feridas, entre outros problemas.
O diabetes tipo 1 resulta na destruição das células que produzem a insulina, portanto os pacientes são insulino-dependentes. Já o tipo 2, que totaliza cerca de 90% dos casos, é caracterizado pela resistência do organismo ao hormônio.
Resultados e próximos passos
“No músculo esquelético de camundongos com resistência à insulina, identificamos um microRNA com expressão diminuída, o qual teve sua expressão revertida ao utilizarmos um fármaco que melhora a sensibilidade a esse hormônio”, conta Rodrigues. O grupo analisa agora se esse microRNA está associado ao diabetes.
Após a análise, que está sendo feita in vitro, será avaliado se tal microRNA é um possível alvo terapêutico para o combate à doença. Em seguida, o laboratório passará para a abordagem in vivo e administrará um anti-microRNA em animais obesos e diabéticos.