Um novo estudo do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP aponta que a obesidade leva a dificuldades no desenvolvimento mamário e na lactação. A equipe envolvida na pesquisa verificou que a obesidade inibe a prolactina, hormônio vital para a maternidade. Trata-se do trabalho de pós-doutorado de Daniella Buonfiglio, que foi orientada pelo professor José Donato Junior, do Departamento de Fisiologia e Biofísica.
Hormônios
“A prolactina é um hormônio que adapta o organismo da fêmea à lactação, o que vai além da produção de leite”, explica Donato Junior. Ela também tem funções de aumento das mamas e modificação do comportamento da mãe, uma espécie de ativação do instinto materno.
Outro hormônio alvo da pesquisa, a leptina é produzida no tecido adiposo e tem como função informar ao cérebro a quantidade de alimento que deve ser ingerido, regulando o acúmulo de energia. Quem tem mais gordura secreta mais leptina, sinalizando que o indivíduo não necessita comer mais.
“Existe uma coexpressão entre os receptores de prolactina e leptina no cérebro”, afirma o professor. Entender precisamente como os dois hormônios se relacionam foi uma motivação para realizar a pesquisa.
Comportamento maternal
Para os experimentos foram utilizadas camundongas, divididas em dois grupos: um que havia recebido dieta normal (controle) e outro, uma dieta hiperlipídica (com excesso de gordura). Após a gestação, a equipe registrou o comportamento das mães e dados sobre a ninhada. As fêmeas obesas não conseguiram manter 85% de seus filhotes.
Essa alta taxa de mortalidade se relaciona à baixa produção de leite e à demora acentuada dessas mães em identificar seus filhotes, reuni-los e amamentá-los, o chamado período de latência. “Esse é o comportamento maternal, ele é estereotipado, então a gente consegue avaliar cada um desses parâmetros”, esclarece Buonfiglio.
Um ponto curioso é que o grupo controle, apesar de ter apresentado taxas elevadas de mortalidade da ninhada (44%), passou por uma segunda gestação, em que todos os filhotes sobreviveram. O hiperlipídico também apresentou melhora, embora menos expressiva. Isso tem relação com o fato de o organismo da fêmea estar “habituado”, por conta da primeira gestação, a hormônios e à experiência como um todo, o que melhora seu comportamento maternal.
Análises em laboratório mostraram que as mamas do grupo hiperlipídico são menos desenvolvidas. “Há uma menor quantidade de ductos e de alvéolos, então o desenvolvimento da glândula mamária é menor”, diz Buonfiglio.
Todas essas características em que as fêmeas obesas apresentarem problemas – leite, mamas e comportamento maternal – estão relacionadas à prolactina. A equipe, então, buscou medir os níveis do hormônio e chegou à conclusão de que o excesso de leptina no animal hiperlipídico impede uma ação do organismo à prolactina
“Esse é o nosso principal dado: no fundo estamos caracterizando um estado fisiológico novo, chamado resistência à prolactina. Provavelmente os hormônios da obesidade, alguma coisa relacionada à obesidade, gera uma condição em que o animal não consegue mais responder adequadamente ao efeito da prolactina”, conclui Donato Junior.
Horizontes
Segundo dados de 2014 do Ministério da Saúde, cerca de 17% das mulheres brasileiras são obesas e 49% do total está acima do peso. Diante disso, a pesquisa, que aborda um campo pouco investigado, demonstra ter extrema importância.
O estudo, que ainda será publicado para a comunidade científica, pretende dar um passo adiante e trabalhar com humanos. No entanto, a pesquisadora relata dificuldades em encontrar um pediatra interessado em colaborar com a equipe. O grupo acredita que uma situação também ocorra com pessoas, já que são modelos semelhantes.