Desde 2012, pesquisadores da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, Inglaterra e Espanha se dedicam ao estudo de uma espécie de planária neotropical que está se instalando na Europa. Há poucos dias, os cientistas concluíram que, ao contrário do que diz a literatura internacional, se tratava de uma nova espécie, ainda não descrita pela ciência. A planária, que ainda não foi nomeada, é do gênero Obama e tem preocupado os europeus por seu predatismo.
A presença desta “planária invasora” foi notada, a partir de 2008, pelos pesquisadores Hugh Jones, da Universidade de Manchester, e Marta Riutort, da Universidade de Barcelona. O pesquisador inglês e o professor Fernando Carbayo, da EACH, inicialmente, classificaram-na como Obama marmorata, espécie conhecida há mais de um século e ocorrente no estado de Santa Catarina. Análises posteriores mostraram, no entanto, que a nova espécie difere morfológica e molecularmente de todas as planárias conhecidas e, assim como a O. marmorata, está presente em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, além da Europa
As planárias fazem parte do filo platelmintes. São pequenos animais invertebrados e, em geral, extremamente sensíveis a mudanças ambientais. Algumas espécies, entretanto, possuem maior capacidade adaptativa e sobrevivem em ambientes diferentes do original, são as chamadas “espécies exóticas” que se podem tornar invasoras. Estas “migrantes” foram dispersas pelo homem, acidental ou intencionalmente. O modo mais recorrente de introdução de espécies exóticas é através do comércio de plantas ornamentais e alimentícias.
Por que elas são perigosas?
Diferente da maioria das espécies de planária, a nova possui alimentação bastante diversa. Enquanto as demais possuem uma presa específica, está é capaz de se alimentar de oito espécies diferentes de animais, segundo testes preliminares. Esse caráter voraz é preocupante, pois a fauna local de pequenos animais terrestres pode sofrer impactos populacionais com a vinda da nova planária.
Além disso, nos anos 1980, algumas espécies do Hemisfério Sul causaram sérios problemas em solos europeus dedicados à pastagem. Por ter dizimado populações nativas de minhocas terrestres, uma dessas espécies foi considerada uma “praga”. O principal agravante é que, sem as minhocas, os pastos se tornaram áreas alagadas, já que o anelídeo mantém o solo drenado naturalmente.
Outras espécies exóticas foram encontradas em criadouros de minhoca, na Europa. Estas minhocas são vendidas como isca para pesca e para a produção de compostagem. Sem predadores naturais, as planárias podem causar importantes danos econômicos nestes criaodouros.
Nova espécie
Por se tratarem de espécies crípticas, extremamente parecidas entre si, os pesquisadores confirmaram a existência da nova planária a partir de sutis diferenças. Morfologicamente, a nova espécie neotropical é um pouco menor e possui uma coloração mais escura. Além disso, suas centenas de olhos estão largamente espalhadas pelo dorso . Seu órgão reprodutor também é menor que o de O. marmorata.
Segundo o pesquisador Fernando Carbayo, parte da pesquisa incluiu discutir o que, afinal, delimita as espécies: "Observamos que a nova planária possuía pequenas diferenças, mas isso não seria suficiente para a separação objetiva de Obama marmorata. Seres humanos possuem estatura e cor diferentes sem deixarem de ser da mesma espécie". Disparidades entre os DNAs apoiaram as suspeitas de que as sutis incompatbilidades morfológicas indicavam uma espécie distinta.
A conclusão da pesquisa contou com a vinda do professor Hugh Jones, através de financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), para o Brasil.