A fototerapia, ou seja, terapia que utiliza luz, aliada a uma substância fotossensibilizadora que reage quando exposta a essa luz é chamada de terapia fotodinâmica. Essa combinação forma uma reação que consegue trabalhar como agente promotor da destruição de microorganismos, além de promover a cicatrização do tecido lesado. O professor Fabio Pogliani, do departamento de Clínica Veterinária da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, e o doutorando Fábio Sellera estão trabalhando com esse método em dois principais tipos de aplicações: a terapia fotodinâmica antimicrobiana (bactérias, fungos, protozoários, algas, leveduras e outros microorganismos) e a terapia fotodinâmica antineoplásica (antitumoral).
Quando uma lesão expõe o tecido ao ambiente, não necessariamente há uma infecção, mas o contato com o ambiente externo já causa a contaminação, que retarda a cicatrização. O objetivo da terapia fotodinâmica é combater a infecção ou evitar que uma contaminação se torne uma infecção. Além disso, a terapia também auxilia a cicatrização, já que a aplicação da luz tem essa propriedade.
Os trabalhos da pesquisa são realizados em ruminantes domésticos (cabras, ovelhas), animais silvestres marinhos (tartarugas e pinguins) e também em animais domésticos (cães e gatos). Pesquisas com esse tipo de tratamento são inéditas na FMVZ e o método já está sendo utilizado na rotina de atendimento do Hospital Veterinário da USP. A grande maioria dos tratamentos que estão utilizando a terapia fotodinâmica é de doenças e feridas na pele, já que ainda não há tecnologia para doenças que não são expostas. Assim, lesões de queimaduras, abcessos, úlceras, lesões parasitárias por larvas de moscas que começam a consumir o tecido (bicheira) e lesões infecciosas são alguns tipos de feridas e doenças tratadas com o método.
Antes, na FMVZ, esses casos eram tratados com o protocolo convencional, que é usar soluções antisépticas e também soluções antimicrobianas, no caso, os antibióticos. Fábio Sellera explica que “a principal vantagem de trabalhar com a terapia fotodinâmica é que, ao utilizar antibióticos, ao longo do tempo acabamos selecionando populações resistentes a esse tipo de medicamento”. Por outro lado, a terapia fotodinâmica, por meio de uma relação oxidativa que ataca as células “de tudo que é lado”, faz com que a célula microbiana não consiga desenvolver linhagens resistentes ao método. Quando se utiliza o antibiótico, ele atua especificamente em um alvo do organismo que, como o passar do tempo, se adapta e consegue bloquear a ação do remédio. “Ninguém é contra usar os antibióticos, mas devemos tentar evitar ao máximo o uso quando temos um outro recuso para que, quando realmente houver necessidade de usar o antibiótico, usemos de forma correta e racional”, aponta o professor Fabio Pogliani.
Outro fator positivo no uso da terapia fotodinâmica é que, ao contrário do antibiótico, a terapia não deixa resíduos na carne e no leite do animal que passa pelo tratamento. Quando espécies domésticas criadas para consumo humano de carne e leite são tratadas com produtos químicos como o antibiótico, há um período de carência em que não se pode consumir os produtos derivados desses animais, já que resíduos do medicamento podem estar presentes. No caso da terapia fotodinâmica, não há esse problema. Pogliani explica que “apesar de o foco da pesquisa não ser a produção de resíduos, e sim o tratamento de casos clínicos, é importante ressaltar que com as substâncias que utilizamos, nós temos a garantia de não deixar resíduos no leite e na carne do animal”.
Outro exemplo do uso da terapia fotodinâmica na pesquisa é em pinguins de aquários. Quando mantidos em cativeiros, esses animais sofrem de fissuras similares às de um diabético. Por ser um animal que, na natureza, ficaria mais de 70% de sua vida no mar, o ambiente inadequado de cativeiro causa a alteração do fluxo sanguíneo que facilita a entrada de microorganismos e a infecção. “Conseguimos comprovar que a terapia fotodinâmica, até o momento, se mostrou uma das melhores formas de tratamento desses casos”, explica Sellera.
Para o uso da terapia fotodinâmica, não adianta utilizar qualquer substância ou qualquer luz, é necessário trabalhar com uma substância que reaja com uma luz em um comprimento de onda especifico. Nessa pesquisa, é usado o azul de metileno que reage com a luz vermelha. A reação dessa combinação associada com o oxigênio celular forma radicais livres que são extremamente tóxicos para os microorganismos, e, por isso, o tratamento combate os microorganismos e facilita a cicatrização.
Além disso, enquanto produzir novas moléculas para novos antibióticos é um processo extremamente caro para a indústria farmacêutica, a terapia fotodinâmica é um procedimento relativamente barato, variando de acordo com a substância utilizada. No caso da pesquisa, o procedimento não é caro pois utiliza apenas o azul de metileno. “Temos apenas o gasto inicial com o aparelho de laser ou de led, mas a substância em si é barata”, explica o professor. De certa forma, isso faz com que o método acabe não sendo favorável para a indústria farmacêutica, que provavelmente não terá interesse na pesquisa. Mas uma coisa não exclui a outra, já que a técnica substitui o antibiótico em alguns casos, mas é apenas complementar em outros.
O procedimento realizado depende de cada caso. Para que o paciente precise tanto do uso de antibiótico quanto da aplicação de terapia fotodinâmica, a infecção cutânea precisa ter um caráter que já comprometa o organismo de forma sistêmica. Por exemplo: se um animal está com um problema no pé, e esse problema já está afetando o osso e causando complicações sistêmicas, como febre, é necessário o uso de antibiótico juntamente com a aplicação da terapia fotodinâmica. “Se o problema for local, e se o animal não deixou de se alimentar, não tem febre, apresentou exames de sangue com resultados normais, podemos usar só a terapia fotodinâmica”, complementa Sellera.