As determinações do judiciário quanto ao pagamento de precatório – dívida pública das Fazendas Federal, Estadual ou Municipal de ressarcimento ao cidadão por ação do governo, como por desapropriações – não são respeitadas pelos governantes e as respectivas Fazendas no Brasil. Em tese de doutorado realizada na Faculdade de Direito da USP, o pesquisador Eurípedes Gomes Faim concluiu que o mau funcionamento do sistema de pagamento de precatório no país se deve, não pela ineficiência dos julgamentos e determinações, mas pela falta de compromisso para cumprí-las.
A atitude é analisada na pesquisa como resultado da desconsideração que os governos têm pelo Judiciário. As decisões tomadas por ele, quando julga que o Estado está errado, não são cumpridas.
Segundo Faim, falta uma cultura de continuidade por parte dos governos no Brasil. Muitas das dívidas de precatórios foram feitas em governos anteriores e a responsabilidade pelo pagamento recai sobre outros governantes, que não têm interesse em quitar a dívida herdada. “Não deu certo por falta de vontade política. Não queria se pagar precatório, porque isso não dá voto”, afirma o pesquisador.
O que mantém esse comportamento é o entendimento da sociedade brasileira de que o papel dos governantes é o de realizar obras, mais do que cumprir com outros deveres sociais. A credibilidade não é dada a quem paga as dívidas, principalmente quando elas são com a população, mas sim aos que tomam ações com resultados visíveis. Faim ressalta que essa mesma cultura é muito prejudicial à economia do País, uma vez que o descompromisso com o pagamento de dívidas pelo Estado afasta investimentos estrangeiros.
Quando o precatório entrou na Constituição, em 1934, foi determinado que o pagamento devido fosse feito em ordem cronológica. Com princípio moralizador, o objetivo era de evitar o acontecia antes da formalização da política, em que os pagamentos eram feitos com base no favoritismo. Não houve compromisso, porém, com os pagamentos, até a implementação da Lei da Responsabilidade Fiscal, em 2000, que obrigou a inserção dos precatórios no orçamento da União.
O precatório, diferente do que comumente se afirma, não surgiu subitamente na constituinte de 1934, e nem é presente exclusivamente no Brasil. A sua existência foi identificada na Constituição de outros 180 países. Em levantamento, Faim demonstrou que a menção ao tema pode ser encontrada há mais de 500 anos, e mesmo antes da sua constitucionalização, em 1934, ele já existia de forma muito próxima à atual no país. Um dos registros da política no Brasil, por exemplo, se encontra no Código Comercial do Império, de 1850.