O novo acordo realizado esse ano entre os EUA e potências ocidentais com o Irã, acerca do combustível nuclear do país, é menos específico que acordo fechado em 2010 pelo Brasil, Turquia e Irã, e pode ter consequências futuras. Essa é a posição de José Viegas Filho, embaixador brasileiro que ministrou o curso de difusão A presença do Brasil no Mundo, realizado pelo Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. “[Em 2010] O Brasil obteve êxito, nós conseguimos um acordo que nenhum outro país conseguiu, mas no final não pudemos colher esses frutos porque os EUA insistiram na política de sanções”, afirma ele.
Em 2010, o Brasil e a Turquia fecharam com o Irã um acordo de troca. O urânio iraniano levemente enriquecido seria deslocado para a Turquia, país membro da Otan, onde ficaria sob guarda conjunta turca e iraniana. Em troca, passado um ano, o Irã receberia 120 quilos de material enriquecido a 20%, adequado para uso como combustível de reator. “O Brasil negociou cerca de um ano ao lado da Turquia para que o Irã concordasse com o acordo de trocas que foi proposto pela AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica da ONU)”, explica José Viegas. “Portanto era coerente com que os EUA e os outros países ocidentais queriam do Irã.”
O embaixador conta que a ideia do acordo se originou a partir de um desejo do próprio presidente Barack Obama. No entanto, depois de assinada, a iniciativa diplomática não foi aceita pelos EUA e pelo Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), que em vez disso aprovou uma nova rodada de sanções contra o Irã nos dias seguintes ao anúncio do acordo. “Os EUA nesse meio tempo preferiram a política de sanções, e Hilary Clinton teve que ser incisiva em derrotar o nosso acordo depois que ele foi assinado”. Apenas a Turquia e o Brasil do Conselho de Segurança da ONU votaram contra as medidas de sanções.
O novo acordo, fechado entre o Irã e as potências ocidentais em 2015, possui caráter mais rígido. Foi acordado, entre outras medidas, que a quantidade de centrífugas do país será reduzida, assim como o estoque de urânio levemente enriquecido. Além disso, inspetores da AIEA poderão ter acesso às instalações e à rede de fornecimento do programa nuclear do Irã e fiscalizar, quando necessário, minas e qualquer outro local ou atividade suspeitos.
José Viegas Filho é um diplomata brasileiro. Já foi Embaixador do Brasil na Dinamarca, no Peru e na Rússia, além de Ministro da Defesa no governo Lula entre 2003 e 2004.
Desde os tempos de Cabral
O Tratado de Tordesilhas, a relação entre o Brasil e Estados Unidos e a análise da política externa brasileira atual. Esses foram alguns dos temas abordados pelo embaixador José Viegas Filho, que ministrou no dia 8 a conferência de tema A presença do Brasil no mundo. O encontro marcou o fim do curso de extensão homônimo promovido pelo Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP, sob coordenação do professor Alexandre de Freitas Barbosa. As aulas ocorreram no Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP e foram destinadas a alunos de graduação (a partir do 5º semestre) e de pós-graduação da USP.
A conferência foi aberta ao público e abordou sob um panorama geral a presença do Brasil no mundo, desde a chegada dos portugueses até os dias de hoje. Um dos pontos importantes levantados por José Viegas para compreender a presença do Brasil no mundo é a singularidade do país, a partir de dois pontos principais: a miscigenação e a aceitação da pluralidade racial e o respeito aos tratados internacionais. “Esses traços estão presentes na nossa história desde o primeiro momento, eles foram se desenvolvendo ao longo da nossa história e continuam até hoje. E são marcas importantes para analisar a presença do Brasil no mundo”, afirma ele.
O curso de difusão A Presença do Brasil no Mundo ocorreu entre os dias 22 de setembro ao dia 8 de outubro, às terças e quintas-feiras. Em seis aulas, os períodos históricos abordados foram desde a colônia à interpretação do momento atual. Muito do que foi abordado consta em seu recém-lançado livro Diplomacia do Brasil, de Tordesilhas aos nossos dias, que publicou com base em sua preparação para o curso: “Foi uma realização pessoal intensa. Eu, que tinha sido convidado em 2013 pra fazer esse curso, pude prepará-lo durante um ano. E escrevi um livro, que é o roteiro dele”.