A maioria das empresas que chegam ao Brasil veêm-se às voltas com um problema já considerado comum na indústria nacional: o fênomeno hockey-stick. Ou seja, picos discrepantes de vendas concentradas no final de cada mês. Isso gera consequências que custam alto para os empreendedores, já que precisam escolher entre gastar muito para aumentar o estoque, mas sem a certeza de que seus clientes pedirão os itens na quantidade que ele está prevendo. Ou esperar até o momento dos pedidos para produzi-los, porém correndo o risco de não dispor dos recursos necessários quando chegar a hora. No entanto uma dissertação produzida dentro da Escola Politécnica da USP fez descobertas que podem ajudar aqueles que tentam lidar com o problema.
A atual indústria de bens de consumo chega a embarcar de 40% a 50% do volume produzido na última semana de cada mês. Isso é extremamente prejudicial por criar uma situação imprevisível diante da qual os empresários precisam lidar. A maioria deles adota a estratégia do “empurra”. Isso significa produzir durante as três primeiras semanas o esperado para ser vendido na última. Consequentemente, um grande estoque é formado, o que pode acarretar em altos custos. Afinal, na última semana, muitas vezes os clientes podem fazer pedidos que fogem totalmente do previsto, obrigando a produção a trabalhar em itens novos enquanto se armazena uma enorme quantidade de produtos não vendidos.
A outra técnica utilizada é chamada de “puxar”. Em vez de produzir antes, a empresa só fabrica aquilo que o cliente pede. Dessa forma é garantido que não haverá desperdício de material. O problema aqui é que na última semana, quando o hockey-stick acontece, a linha de produção fica extremamente saturada e não dá conta de atender a todos os clientes. Em ambas as técnicas, nada é garantido e é preciso lidar com a imprevisibilidade do mercado, arriscando perder na qualidade do serviço prestado ou no dinheiro investido em matéria-prima.
Todavia, a pesquisa feita por Renato Gioelli Basso, baseada em vários estudos de caso, descobriu uma empresa que desenvolveu uma nova técnica para lidar com as limitações na produção que o hockey-stick impõe. A empresa em questão trabalhava com uma técnica híbrida inédita. Segundo o pesquisador, existem três tipos de técnicas híbridas de produção: a horizontal, quando uma parte da produção trabalha de forma puxada e a outra empurrada, a vertical, quando a área de planejamento empurra e a de produção puxa, e a paralela, que se caracteriza por aplicar o empurra ou puxa em diferentes produtos dentro de uma mesma indústria.
A nova estratégia, no entanto, leva em consideração o tempo, e por isso foi batizada por Basso de Temporal. Nela se produz um volume fixo durante as três primeiras semanas, trabalhando de forma empurrada, e na última semana a produção se torna puxada, fabricando apenas aquilo que é requisitado pelos clientes. A nova técnica foi descoberta depois que os empreendedores da empresa em questão resolveram parar de produzir baseados em previsão. Eles fizeram uma análise do que saía com toda certeza e conseguiram garantir a produção de 80% do volume de estoque já no início. No final do mês, eles apenas produziam pedidos mais específicos dos clientes.
Segundo Basso, o problema do hockey-stick é comum e ninguém conseguiu ainda resolvê-lo completamente: “O que é perceptível na investigação é que todos tem esse problema do hockey-stick: todo final do mês tem um pico de 50% a 60% da produção. Ninguém ainda conseguiu resolver. O que a maioria faz é trabalhar empurrado com o estoque alto para não impactar o cliente.” No entanto, durante sua pesquisa, foi encontrada uma produtora que havia conseguido superá-lo. Isso porque ela resolveu atacar a raiz do problema, que são os descontos dados por vendedores interessados em bater suas metas ao final do mês: “O presidente comprou a briga e disse ‘aqui não, não teremos esse desconto de final de mês’”.
As empresas podem tentar ou encarar as raízes do problema colocado pelo hockey-stick ou tentar lidar com ele de formas imprevisíveis, como a empresa achada na dissertação fez. “Tem dois grandes achados dessa dissertação: um deles é não desistir, tentar atacar a causa. A gente sabe toda a dificuldade que tem, a dissertação fala bastante das dificuldades que existem. Caso você não consiga eliminar a causa, você tem outra alternativa que está dentro do seu controle”. Além de um ponto interessante para questões acadêmicas, a pesquisa demonstra como a análise teórica aliada à prática pode beneficiar até mesmo economicamente aqueles que souberem aproveitar-se dos conhecimentos.