A parede celular é a responsável pela arquitetura, defesa e percepção do ambiente das plantas. Além disso, essas paredes são ricas em açúcares, como a glicose, elemento essencial para a produção de etanol, biocombustível muito utilizado nos dias de hoje. O estudo da degradação da parede celular, que é feita por enzimas produzidas pela própria planta, é promissor na área de produção do etanol celulósico.
Nas raízes de algumas plantas, principalmente das plantas que sofrem alagamento, há a produção de uma estrutura chamada de aerênquima, que é um tecido responsável pela oxigenação dos tecidos nas plantas. Embora esse tecido seja mais encontrado em plantas aquáticas, o aerênquima também é encontrado em algumas espécies da cana de açúcar produzidas no Brasil. Após o alagamento, as células recebem uma sinalização da falta de oxigênio no tecido e inicia a produção de enzimas que degradam a parede celular, formando espaços de ar chamados de aerênquima. A tese de doutorado da bióloga Adriana Grandis explica quais são estas enzimas que atacam a parede celular da cana e em que momento são produzidas.
Utilizando uma variedade de cana de açúcar, que produz o aerênquima nas raízes, foi possível verificar as enzimas que degradam a parede celular. Além disso, o estudo também pôde averiguar que essa degradação só era ativada a partir de um estímulo na raiz, como uma forma de proteger e garantir o crescimento das raízes e das plantas. A origem desse estímulo, porém, ainda é desconhecido.
No estudo, Adriana verificou que a produção das enzimas ocorre antes mesmo do aerênquima ser formado. O ataque a elas, porém, depende da arquitetura da parede celular, que também depende de sua composição e do acesso aos polissacarídeos contidos na parede (como a celulose). Essa relação entre polissacarídeos e enzimas é determinante para o crescimento da planta e a produção de aerênquima.
Foi a partir de três diferentes técnicas – análise de genes, proteínas e atividade de enzimas (realizada na Universidade de Roma) que a bióloga identificou e quantificou as enzimas da parede celular de raízes de cana, e quais eram funcionais para a célula, que resultavam na degradação de alguns polissacarídeos. Foram localizadas 35 proteínas responsáveis pela degradação do aerênquima, como por exemplo a GH-17 (Glicosil hidrolase) e algumas pectinases. “Após a observação de segmentos ao longo das raízes, foi possível identificar que quanto menos pectinas (polissacarídeo de parede celular), maior era a sacarificação desse tecido (produção de açúcar e etanol) ”, explica Adriana.
O projeto, que teve início em 2011, foi orientado pelo professor Marcos Silveira Buckeridge, do Instituto de Biociências da USP (IB), e contemplou outra de doutorado e uma dissertação de mestrado por envolver grande complexidade temática.
O futuro se mostra favorável na área de produção de etanol. Para Adriana, se for descoberto como aumentar a produção dessas enzimas em diferentes áreas da planta (não somente na raiz), será possível aumentar o acesso aos açúcares da parede celular, e consequentemente aumentar a produção de etanol. E dessa maneira, com plantas que se auto-degradam, a utilização de elementos químicos durante o processo na indústria seria menor, reduzindo os resíduos químicos utilizados na produção do combustível. Além disso, será possível aumentar a eficiência do processo nas próprias plantas.