ISSN 2359-5191

24/02/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 19 - Ciência e Tecnologia - Escola de Enfermagem
Estudo propõe parâmetros para calcular quantidade de enfermeiros para Unidades de Saúde da Família
Levantamento da forma como eles trabalham em postos de saúde foi base de cálculo da quantidade de profissionais necessários para atender população
Foto: Reprodução FHO Uniararas

Na hora de montar uma empresa, muita gente não sabe quantos funcionários contratar (isso quando a grana permite ter empregados). Independentemente do tipo de negócio, é sempre importante ter a quantidade certa de pessoas na equipe para que o patrão não desperdice dinheiro contratando mais gente do que é necessário, ou sobrecarregando empregados pra economizar. Esse pensamento também é válido nas instituições públicas brasileiras, como as Unidades de Saúde da Família (popularmente conhecidas como "postos de saúde"). Daiana Bonfim, enfermeira, desenvolveu doutorado na Escola de Enfermagem da USP, e propôs parâmetros para calcular a quantidade de profissionais necessários para qualquer Unidade de Saúde da Família do Brasil.

Existem hoje no país aproximadamente 35 mil equipes trabalhando em Unidades de Saúde da Família, e cada uma delas atende, em média, de três a quatro mil pessoas. Atualmente, a quantidade de profissionais em cada "posto de saúde" é calculada de acordo com a composição de equipe mínima proposta pela Política Nacional de Atenção Básica, atualizada em 2012 pelo Ministério da Saúde. "Só que o problema é que nem sempre a quantidade de profissionais proposta é suficiente para atender as demandas e diversidades encontradas nas Unidades de Saúde da Família distribuídas no território Brasileiro", alerta a enfermeira.

Mas então como elaborar um modelo para o cálculo de profissionais em Unidades Básicas de Saúde? Daiana teve como parâmetro inicial  o método proposto por sua orientadora, Raquel Rapone Gaidzinski, que é guiado pela carga de trabalho de cada profissional dos "postos de saúde". Para estabelecer uma proposta de modelo, Daiana verificou, com o Ministério da Saúde, quais eram as melhores Unidades de Saúde da Família com base nos resultados da avaliação do Programa de Melhoria de Acesso e Qualidade – Atenção Básica (PMAQ). Foram selecionadas 27 unidades, em 12 cidades de 10 estados, e cada uma delas foi visitada por uma equipe de observadores supervisionada pela Daiana. Eles registraram, a cada 10 minutos, quais atividades e intervenções os profissionais realizavam durante a jornada de trabalho. "A diversidade dos municípios bem como das Unidades de Saúde da Família incluídas na pesquisa foram fundamentais para subsidiar parâmetros tanto a nível nacional, como por estrato sócio econômico demográfico dos municípios proposto pelo PMAQ”, comenta Daiana. A equipe de observadores ficou durante uma semana em cada "posto de saúde", e realizou aproximadamente 40 horas de observação por semana.

Ao final desse processo de visitação, foram realizadas aproximadamente 27 mil observações dos profissionais de enfermagem, e 80 mil quando incluídos todos os profissionais que compõem a equipe mínima de todas as 27 Unidades de Saúde da Família visitadas no Brasil. Com essa quantidade de registros, a pesquisadora classificou as atividades e intervenções observadas  de cada profissional.

Os enfermeiros gastam, em média, no Brasil 59% do tempo de trabalho em intervenções (cuidado direto e cuidado indireto),  7% em atividade associada, 13% com  atividade pessoal, 3% em espera, 15% ausentes, e 3% não foi observado .

Já a distribuição percentual média da jornada dos técnicos e auxiliares de enfermagem no Brasil foi de 41% em intervenções, 13% atividade associada, 16% atividade pessoal, 16% tempo de espera, 12% ausência, e 2% não foi observado.

Apesar do percentual de atividades pessoais parecer elevado, ele está em conformidade com números registrados em outros países, segundo Daiana.

Para a enfermeira que coordenou a pesquisa, “um outro dado encontrado com as observações é o tempo efetivo de trabalho,  que pode chegar a percentuais em torno de 80% a 85% se o tempo em espera e a ausência dos profissionais forem melhor aproveitados”, explica a enfermeira.

A partir da obtenção de todos esses números e constatações, Daiana chegou a parâmetros nacionais, regionais e por estrato sócioeconômico demográfico (PMAQ-AB) para calcular quantos profissionais são necessários em cada Unidade de Saúde da Família, levando em conta as especificidades de cada uma delas. "Tem unidades, por exemplo, que possuem muitos idosos, e outras  que atendem muitas crianças. Além disso, uma USF em São Paulo é completamente diferente do que a de uma cidade do interior do estado do Amazonas. Queríamos disponibilizar parâmetros para cálculo de profissionais que abrangessem todas essas unidades, com todas as diferenças dos territórios –  e ao que tudo indica até agora, conseguimos isso", justifica.

Nos próximos meses, a enfermeira começará a agendar novas visitas a Unidades de Saúde da Família para fazer testes dos parâmetros encontrados durante o doutorado. Além disso, calculam de forma científica, e não empiricamente, a quantidade de profissionais necessários para cada Unidade de Saúde da Família do país todo.

E Daiana sonha alto: "a ideia é que os parâmetros possam ser um dos referenciais para subsidiar os processos decisórios e influenciar políticas públicas de planejamento da força de trabalho no Brasil”. Todos saem ganhando – sociedade e pesquisadora.  

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