ISSN 2359-5191

13/04/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 38 - Economia e Política - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
Queda recente da desigualdade no Brasil deve-se a políticas públicas
Pesquisa confirma que boom econômico da China não foi responsável pela distribuição de renda brasileira
Foto: Reprodução/FGV

A diminuição recente da desigualdade social no Brasil teve como causa principal as políticas sociais criadas entre 2000 e 2010. Os dados, divulgados por pesquisa da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, indicam que a expansão do salário mínimo e o aumento de profissionais formados no ensino superior foram determinantes para a melhoria na distribuição de renda do país.

O estudo demonstrou que a expansão do salário mínimo contribuiu para redução da desigualdade entre os trabalhadores. Como parte da força de trabalho não qualificada possui salário igual ao salário mínimo, o aumento desse valor estaria diretamente relacionado à elevação do pagamento desses trabalhadores, enquanto o salário de outros profissionais não é afetado. Essa redução na diferença entre salários contribuiu para a diminuição da desigualdade econômica.

Outro fator analisado foi o aumento da mão de obra qualificada no Brasil. Segundo a pesquisa, a elevação do número de profissionais graduados — que em média possuem melhores salários — aumentou a concorrência no mercado de trabalho e, consequentemente, reduziu o seu preço. Assim, também houve redução da desigualdade salarial entre trabalhadores qualificados e não qualificados.

A pesquisa contraria a ideia de que a China estaria por trás do crescimento econômico e da queda da desigualdade observados no Brasil na primeira década dos anos 2000. Para o responsável pelo estudo, Alison Oliveira, a forte troca comercial entre Brasil e China aumentou o nível salarial dos trabalhadores de algumas regiões brasileiras, mas não afetou de maneira significativa a distribuição dos rendimentos entre eles.

Para chegar a esse resultado, foram analisadas as 530 microrregiões brasileiras definidas pelo IBGE, compostas por aproximadamente dez municípios cada. Segundo Alison, as microrregiões reagem de maneira diferente aos mesmos fenômenos econômicos. “Quando a China aumenta a importação de minério de ferro, por exemplo, uma microrregião no vale do aço em Minas Gerais sofre um aumento da demanda por mão de obra de trabalhadores desse setor, mas outra microrregião que vive basicamente do comércio local não é afetada”, explica o pesquisador. Com base nessas diferenças, a pesquisa comparou o comportamento das microrregiões diante da forte expansão comercial chinesa, da expansão do salário mínimo e do aumento da oferta de mão de obra qualificada no Brasil observados no período entre 2000 e 2010.

Guinada do salário mínimo

A trajetória de expansão do salário mínimo revela que houve um aumento de aproximadamente 95% entre 1995 e 2012. A sucessão acentuada de aumentos iniciou-se a partir de 1998 e, desde então, houve valorização em termos reais. Mais de 70% dessa valorização aconteceu entre 2000 e 2010, quando o salário mínimo cresceu cerca de 69%.

No período analisado, o maior aumento do salário mínimo ocorreu entre 2005 e 2006, o equivalente a um ajuste de 13,54 %. Fonte: IPEADATA

Políticas sociais a favor da educação

O crescimento da mão de obra qualificada no Brasil está relacionado a diversos fatores, como o aumento de renda das famílias. Estima-se que os 10% mais pobres do país tiveram uma evolução de renda acumulada de 91,2% entre 2001 e 2011, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “Com os pais ganhando mais, os jovens passaram a poder esperar para ingressar no mercado de trabalho e também a se dedicar mais aos estudos”, explica Alison.

O pesquisador cita a valorização do salário mínimo, a expansão do crédito e o Bolsa Família como fatores que contribuíram para o aumento de renda da população menos favorecida. “Essas políticas sociais aumentaram o poder de barganha dos trabalhadores mais pobres, os quais puderam exigir maiores salários por seus serviços”. Contudo, ele ressalta que existem outros determinantes importantes para a melhoria de renda.

A ampliação no volume de vagas no ensino superior também colaborou para o aumento da mão de obra qualificada no Brasil. No governo FHC, investimentos no ensino privado fizeram com que o número de universidades particulares subisse de 684 em 1995, para 1.442 em 2002 — um aumento de 200%. Já no governo Lula, além das 18 universidades federais criadas, o número de matrículas no ensino superior quase dobrou, de 3,7 milhões para 7 milhões.

Os dados estão relacionados principalmente à política de inclusão com a criação do Programa Universidade para Todos, o ProUni. “Tais políticas resultaram em forte aumento da oferta de vagas e, consequentemente, no aumento da oferta de trabalhadores com ensino superior”, conclui Alison.

Contribuição chinesa

Até então, a China era considerada um dos fatores responsáveis pela diminuição da desigualdade no Brasil devido ao seu boom econômico, que contribuiu para fortes trocas comerciais com os brasileiros a partir de 2000. Os chineses chegaram a aumentar sua exportação em 17 vezes e a vender um valor 23 vezes maior para o Brasil no período analisado, disparando de dois para 55 bilhões de dólares em transações comerciais.

Os resultados, entretanto, não mostram uma correlação entre o aumento do fluxo comercial e a distribuição de renda no Brasil. “Isso deixa claro, por exemplo, que não devemos pensar que a desaceleração da economia chinesa levará necessariamente a um aumento da desigualdade no país”, constata o pesquisador.

Como a crise afeta a desigualdade

Apesar dos significativos avanços na distribuição de renda, o Brasil ainda figura entre os 15 países mais desiguais do mundo. Dados do Ipea mostram que a desigualdade voltou a aumentar no ano passado devido a taxa de desemprego, que vem subindo sistematicamente desde o início de 2015. É primeira vez no século que o fenômeno acontece.

Para Alison, os resultados do estudo tendem a ser mais relevantes em crises econômicas como a enfrentada pelo Brasil atualmente. Isso porque, segundo ele, a desigualdade está fortemente relacionada ao aumento do desemprego e à diminuição de renda das famílias.

Para amenizar o cenário crítico, o estudo sugere que a valorização do salário mínimo e a expansão do acesso ao ensino são políticas que deveriam ser consideradas. “Precisamos melhorar muito nesse quesito”, afirma. “Entender os mecanismos por trás da queda da desigualdade pode contribuir bastante para que consigamos alcançar esse objetivo”.

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