Na tese de doutorado de Evandro Segundo, o pesquisador estudou a produção de mésons vetoriais em colisores a fim de desvendar se seria possível explicar esse mecanismo sem incluir os glúons ou quarks, partículas subatômicas. O título de sua tese resume bem os objetivos da sua pesquisa, assim como o método aplicado no estudo: “Produção de mésons vetoriais em colisões ultraperiféricas com o código de Monte Carlo CRISP”. Para entender do que se trata, é necessário destrinchar o significado de cada palavra.
Uma colisão é ultraperiférica quando os núcleos a colidir não interagem por meio de seus nucleons (prótons e nêutrons), mas apenas pelos seus campos eletromagnéticos ao redor do núcleo, que podem ser descritos como fluxos de fótons. Assim, quando há a colisão os nucleons interagem com os fótons do outro.
Mésons vetoriais são partículas subatômicas que são produzidas através de colisões de alta energia entre fótons e nucleons, efetuadas em um aparelho chamado colisor. No caso do seu estudo, Segundo utilizou simulações computacionais através de um método matemático estatístico, o Monte Carlo, para simular essas reações. Em outros estudos envolvendo mésons vetoriais, a intenção é conhecer cada vez mais o que acontece no interior do núcleo, mais precisamente, como se distribuem os quarks e os glúons dentro das partículas nucleares. “O objetivo tanto experimental quanto teórico é determinar como estão distribuídos os glúons dentro do núcleo. Então, promove-se uma reação nuclear, neste caso com nucleons e fótons, partículas que não tem massa e também são responsáveis pelo que chamamos de luz. Na reação, o fóton interage com o núcleo e sai como méson vetorial. E porque ele não sai mais como fóton e, sim, como méson? Depende de como e com o que o fóton interagiu no núcleo, entendeu? Assim, podemos saber o que há lá dentro”, explicou o pesquisador.
Sua tese, porém, segue outro objetivo e tenta por à prova a ideia de que não há como explicar a produção de mésons vetoriais sem entender como os glúons se distribuem dentro do núcleo. Segundo Evandro, há mais de uma hipótese para essa distribuição. A dificuldade é saber qual é a certa e sua pesquisa vem no sentido de independer desse conhecimento para explicar a produção de mésons. Nas conclusões, Segundo se deparou com um entrave: daria para explicar só até certo ponto, a partir de então, seria necessário conhecer essa distribuição. Esse ponto seria justamente a quantidade de energia envolvida na reação nuclear.
O resultado da simulação foi comparado com dados experimentais da colisão de íons de chumbo da colaboração Alice (A Large Ion Collider Experiment), do Cern, Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear, na Suíça e da colisão de íons de ouro da colaboração Phenix (Pioneering High Energy Nuclear Interaction Experiment) do laboratório Rhic nos Estados Unidos. Nas duas ocorre a produção do méson J/ψ (lê-se jotapsi), alvo da pesquisa do Evandro Segundo, porém as energias envolvidas são diferentes, no caso do chumbo são de 2.76 TeV (teraeletronvolts) e no do ouro, 200 GeV (gigaeletronvolts). Utilizando o método de Monte Carlo, mas sem considerar a existência de glúons, Evandro conseguiu descrever a produção do méson vetorial quando a energia foi menor, caso do ouro, mas não conseguiu acertar quando a reação foi com chumbo. Eletron-volt é uma unidade de medida de energia, sendo GeV da ordem de um bilhão e TeV, de um trilhão de eletron-volts.
Em seu modelo, estão incluídas todas as reações pelas quais o méson J/ψ passa até sair do núcleo. O pesquisador examinou características importantes, como a distribuição de rapidity, relacionada com o momento linear de uma partícula, e a distribuição de momento transversal, que é a porção do momento diretamente relacionada com a interação. Evandro usou os dados experimentais de rapidity do Alice e do Phenix, em que o méson foi detectado saindo a 90º graus em comparação com a direção que o fóton entrou no núcleo, o que significa que a partícula perdeu momento longitudinal e ganhou momento transversal. A partir disso, pode-se concluir que o fóton interagiu com algo dentro do núcleo que causou essa mudança de direção.
As figuras mostram as distribuições de rapidity para as duas colisões estudadas comparando o modelo utilizado, e outros existentes, com os dados experimentais dos laboratórios citados. No caso do ouro, o experimento mediu a produção total do méson, com uma parcela do que se chama produção incoerente em torno de 40%. O cálculo utilizado em sua pesquisa simulou exatamente essa produção incoerente, que é quando o fóton interage com um nucleon. A produção coerente é quando o fóton interage com o núcleo como um todo. No caso do chumbo, o experimento já diz respeito à produção incoerente e, nesse caso, o resultado do seu cálculo ficou bem acima.
Segundo concluiu que é preciso incluir essas partículas subatômicas no cálculo de produção de mésons para valores de energia acima de 200 GeV. Seu objetivo foi colocar à prova uma ideia usada até hoje, a de que necessita-se do conhecimento sobre os glúons para descrever as reações de produção de mésons. No final, confirmou-se que é necessário tal conhecimento. Porém, sua utilização dependerá do total de energia envolvida na colisão.