Uma pesquisa realizada pelo professor Rodolfo Hoffmann, especialista em distribuição de renda pelo Departamento de Economia, Administração e Sociologia (LES) da Escola de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ) da USP, aponta que o índice de Gini (usado como medidor da desigualdade de distribuição de renda em todo o mundo) tem crescido durante os últimos anos no Brasil. O índice atribui um valor entre 0 e 1 à desigualdade, sendo 0 a igualdade absoluta e 1 a total desigualdade. No primeiro trimestre de 2016, o Brasil recebeu 0,550; no último trimestre de 2013, o valor mais baixo foi registrado: 0,526.
Em termos regionais, há uma grande disparidade entre as Unidades da Federação. O professor aponta que, segundo dados da PNADC (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), do IBGE, para os primeiros meses de 2016, o Distrito Federal é o mais desigual, com Gini de 0,600. Santa Catarina se opõe como o estado mais igualitário, registrando 0,423. São Paulo se coloca discretamente acima do valor médio nacional, com 0,558.
Hoffmann alerta, entretanto, que estes cálculos levam em consideração todos os membros da População Economicamente Ativa (PEA), ou seja, ocupados e desempregados. O rendimento destes últimos é considerado nulo, o que contribui para a dilatação da desigualdade teórica. “Quando a análise se restringe às pessoas ocupadas (excluindo os desempregados), o índice de Gini permanece estável”, destaca. O professor afirma que, em última análise, o aumento do desemprego tem relação direta com o aumento das métricas de desigualdade.
A força de trabalho não reage de forma homogênea aos períodos de recessão. Hoffmann explica que a mão de obra menos qualificada é a primeira a sofrer com os cortes. Segundo ele, isso acontece “porque eles poderão ser mais facilmente substituídos quando a economia voltar a crescer”. Os mais especializados, por outro lado, são geralmente mantidos pelos empregadores. “Um empregado com experiência e conhecimentos específicos para o funcionamento da empresa tende a ser preservado, pois será difícil encontrar outro igualmente competente”.
O professor também ressalta como a diminuição ou o estanque da renda atingem de formas absolutamente diferentes os trabalhadores de classes sociais distintas. “O rico se diferencia do pobre mais pelo seu estoque de riqueza do que pelo nível de renda. Então o rico pode, tipicamente, usar seu capital para amortecer o impacto da queda de renda sobre seu consumo, uma possibilidade normalmente inexistente para o pobre”. Ele lembra ainda que mesmo em momentos de crise, algumas categorias são beneficiadas. “Um sapateiro disse que estava com mais serviço, talvez porque, com a crise, mais pessoas optassem por consertar o calçado usado antes de comprar um novo”, comenta.
Ainda segundo dados da PNADC, as porcentagens de trabalhadores com rendimento menor ou igual a R$ 200, R$ 400 ou R$ 600 são, respectivamente, 14,7%, 19,7% e 24,3%. Os que recebem menos de um salário mínimo (R$ 880) são 39,3% da força de trabalho. Na outra extremidade, somente 20% tem rendimento superior a R$ 2 mil mensais e 5% recebem mais de R$ 5 mil. Quanto a renda declarada, os 5% mais abastados ficam com 30,6% de todo o capital.
Hoffmann frisa, no entanto, que as informações sobre renda nas PNADs são geralmente subdeclaradas. As estatísticas apontam que a defasagem média varia entre 30% e 40%. “Tendo em vista a subdeclaração dos rendimentos, é possível que o verdadeiro limite inferior dos 5% com maiores remunerações seja R$ 10 mil”, declara o professor. “É interessante notar que pessoas com rendimento acima de R$ 10 mil geralmente se consideram da ‘classe média’. Estatisticamente, é muito estranha a ideia de uma ‘classe média’ que faz parte do vigésimo mais rico”.