São Paulo (AUN - USP) - O Projeto Atlantis, que estuda os aspectos ecológicos das populações de cetáceos (baleias e golfinhos) do litoral de São Paulo e do Paraná está prestes a se tornar uma organização não governamental (ONG). A pesquisa, mantida por alunos da pós-graduação do Instituto de Biociências, estava, até hoje, vinculada informalmente à universidade. Com a transformação em ONG, Marcos César de Oliveira Santos, biólogo formado pela USP e coordenador dos trabalhos, espera facilitar a captação de recursos para financiar o projeto e descentralizar as atividades. “Quase todo o orçamento vinha sendo tirado do nosso próprio bolso”, diz Marcos.
Criado há seis anos, o Atlantis promove pelo menos de uma viagem por mês a campo. As pesquisas são realizadas com as populações de boto tucuxi marinho (Sotalia fluvialitis) do estuário de Cananéia, no litoral sul de São Paulo e, a partir do ano passado, estenderam-se para a região de Guaraqueçaba, no Paraná. O pesquisadores procuram traçar um padrão de comportamento do boto, e criar condições para a preservação da espécie. O Atlantis já tem 207 animais catalogados, 64 deles bem monitorados. Foram identificados indícios de uma sociedade entre os animais, com cooperação mútua e organização matriarcal, em alguns grupos. De acordo com Marcos, é comum encontrar fêmeas que deixam seus filhotes com outras fêmeas do grupo na hora de buscar comida. O pesquisador observou também que há filhotes que continuam próximos das mães, mesmo após tornarem-se independentes. Ele acredita que haja motivos estratégicos para o fenômeno. Os machos permaneceriam com as fêmeas para a divisão das tarefas, facilitar os sistemas de comunicação e de localização de presas. “Eles atacam em grupo”, explica.
Apesar de existir em praticamente toda a costa brasileira, o boto tucuxi marinho é uma das espécies de cetáceos menos conhecida. Isso se deve, em parte, à pequena quantidades de pesquisadores que estudam mamíferos marinhos no país: somente cem (para efeito de comparação, a mesma quantidade de pesquisadores que há na cidade de Seatlle, por exemplo). O Atlantis é um dos únicos projetos no mundo a pesquisar a espécie e, apesar das dificuldades, tem alcançado importantes resultados e projeção internacional. Segundo Marcos, o Brasil é um dos poucos locais em que a pesquisa de cetáceos não foi dominada pelos americanos . “Aqui não há abertura”, diz o biólogo. De qualquer maneira, a ajuda internacional é muito importante, já que o país não dispõe de tecnologia nem de recursos para a realização dos estudos.
Com a transformação do projeto em ONG (prevista para o mês que vem), o pesquisador acredita poder chamar a atenção de instituições nacionais e internacionais, para obter apoio financeiro. Até hoje o orçamento do projeto (cerca de 25 mil por ano) foi pago com o dinheiro conseguido em palestras, cursos ministrados na própria universidade e com o bolsas da Fapesp. O projeto não tem uma base no litoral nem transporte próprio.
Para levantar fundos para este ano, Marcos planeja abrir espaço nas viagens de pesquisa para pessoas que desejem acompanhar a observação dos animais. “A procura é grande; aparece pelo menos um estudante por semana querendo fazer estágio com a gente”. Assim, o projeto pretende também conscientizar as pessoas da importância da preservação da fauna do litoral. Além disso, Marcos ressalta a importância de estimular o turismo ecológico no habitat natural dos animais, como já acontece em várias partes do mundo. De acordo com ele, nos cativeiros dos parques temáticos, também muito procurados para o turismo, os animais são maltratados e vivem menos. “A cabeça das pessoas tem que mudar; elas devem procurar conhecer a natureza onde ela está, e em seus próprios termos”, afirma.