ISSN 2359-5191

28/09/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 114 - Arte e Cultura - Instituto de Estudos Brasileiros
Pesquisa analisa as diferenças na concepção de sertão das obras de Caio Prado Jr. e Euclides da Cunha
Carta de Caio Prado Jr. endereçada a Casa Euclidiana ressalta divergências dos autores em suas concepções acerca do sertão nordestino
Xilogravura “O Vaqueiro no Sertão” do artista plástico José Miguel

A dissertação da mestranda Talita Collacio, Os Sertões de Euclides da Cunha e "os sertões" de Caio Prado Júnior: um universo entre literatura e história, se dedica a analisar os métodos utilizados por Euclides da Cunha e Caio Prado Júnior ao descrever o sertão brasileiro. A relação entre as duas obras surge quando Collacio encontra, no arquivo em que catalogava, uma carta de Caio Prado Jr. endereçada à Casa Euclidiana, local destinado a divulgar a vida e obra de Euclides da Cunha. O documento data de abril de 1960 e nele, Prado Jr. afirma que o local descrito por Euclides da Cunha na obra “Os Sertões” não condizia com a realidade que havia presenciado quando viajou pelo sertão.

Um viés adotado pela mestranda ao estudar as obras, já que se trata de uma análise interdisciplinar, foi observar os métodos adotados pelos escritores na concepção de seus textos. Euclides da Cunha havia se aproximado da teoria positivista, corrente filosófica francesa que acredita no progresso a partir de sua imposição, e também do determinismo, teoria que procura definir o homem por fatores como o meio em que vive, a etnia e o momento histórico.

Esse posicionamento tem forte relação com a maneira que o autor enxerga o sertão nordestino, inclusive no livro “Os sertões” nota-se a divisão em três partes “A Terra”, “O Homem” e “A Luta”. Nas duas primeiras partes o autor descreve detalhadamente aspectos da paisagem local e características da população que ali estava instalada, enquanto que em “A Luta” Euclides da Cunha narra a Guerra de Canudos (1896 - 1897), confronto entre o exército nacional e um grupo que havia se organizado socialmente liderados por Antônio Conselheiro, uma espécie de figura messiânica.

Já a formação de Caio Prado Jr. foi bastante diferente da de Euclides da Cunha. Próximo ao marxismo, o autor se utilizou do materialismo histórico-dialético, método que tem a economia como base para analisar as estruturas sociais, para descrever os diversos locais do Brasil pelos quais passou. Em suas obras discorre sobre a política, a economia e a história do território nacional, esse ponto de vista é observado em suas obras, pois Prado Jr. vê na estrutura do sertão o reflexo de uma política econômica excludente e a partir dessa perspectiva discorre acerca do local.

Sobre as obras Collacio afirma que “Nas duas análises, o sertanejo se destaca como elemento formador da nossa nacionalidade”. Ainda sobre a representação do sertanejo nas obras, ela ressalta que enquanto na obra euclidiana a figura do sertanejo é vista como o herói de sua realidade e residente de um Brasil despovoado, um “Hércules Quasímodo” como é intitulado pelo autor, a obra de Caio Prado Jr. descreve o homem do sertão como um indivíduo integrado na lógica socioeconômica nacional e não enxerga o mesmo caráter heroico observado por Euclides da Cunha.

Em sua pesquisa, Collacio chama atenção para o papel de complementação que uma obra traz sobre a outra, pois os textos desses autores quando colocados frente a frente trazem uma interpretação interessante da representação do sertão e do sertanejo no imaginário nacional. A dissertação de Collacio foi defendida no Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (IEB/USP) sob orientação do professor Alexandre de Freitas Barbosa. 

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