São Paulo (AUN - USP) - Pacientes submetidos à radioterapia de cabeça e pescoço e à quimioterapia de altas doses geralmente apresentam lesões ulcerativas na mucosa da boca semelhantes a aftas, cuja intensidade varia de pessoa para pessoa. Esse quadro, conhecido como mucosite oral, causa desde leve desconforto até dificuldades para comer e falar o que, muitas vezes, chega a provocar a interrupção do tratamento oncológico.
Para diminuir o aparecimento deste efeito colateral o Laboratório Especial de Laser em Odontologia (Lelo) da Faculdade de Odontologia (FO) da USP, coordenado pelo Prof. Dr. Carlos de Paula Eduardo, conta há quase dois anos com um projeto de atendimento gratuito especializado na prevenção e tratamento da mucosite oral. O projeto, financiado pela Fapesp, trabalha em parceria com hospitais da rede pública, que enviam pacientes oncológicos para realizar o tratamento com laser no laboratório.
De acordo com Ana Claudia Luiz, mestranda em semiologia e voluntária do Lelo, os pacientes participantes do projeto dividem-se em dois grupos: aqueles submetidos à radioterapia de cabeça e pescoço e aqueles em tratamento quimioterápico. Os primeiros começaram a ser atendidos na clínica em 2005, enquanto os últimos foram incorporados ao projeto este ano.
Para prevenir a mucosite oral, é importante que o paciente inicie o tratamento odontológico antes de começar a radio ou quimioterapia: "Se esse paciente tem, por exemplo, um dente cariado, é um foco de infecção que pode causar problemas durante a terapia. O ideal é que o paciente faça o tratamento odontológico antes de começar o tratamento médico, removendo todos esses focos infecciosos". Iniciada a radio ou a quimioterapia, começa o tratamento com laser, que tem como função prevenir a mucosite oral.
Grande parte dos médicos, no entanto, costuma encaminhar o paciente à clínica somente quando ele já está com bastante dor e as lesões já começam a ameaçar o tratamento: “Nesses casos, é mais complicado. O laser também apresenta ação analgésica e reparadora de feridas, mas a prevenção é mais efetiva”.
Ambas as terapias oncológicas são agressivas à mucosa oral. A redução da salivação é outro efeito colateral, que, além de causar muito desconforto ao paciente, favorece o aparecimento das ulcerações. No caso da radioterapia, as células da boca recebem diretamente a radiação e têm sua renovação comprometida, o que resulta no surgimento das feridas. Nesse sentido, o laser atua estimulando a reparação de tais células: "Quando é feito o tratamento com laser preventivo, há diminuição no aparecimento da mucosite. Quando ela aparece, é em graus menores, 1 e 2, mas o paciente não chega a ter os graus que são considerados severos, que são o 3 e o 4" . Dependendo da dose ministrada, as aplicações de laser podem ter o efeito de prevenção e de reparação (nos casos em que as feridas já estão instaladas), além de apresentar um importante componente analgésico, proporcionando maior conforto ao paciente.
A utilização do laser neste tipo de tratamento foi estudado pela odontologista Fernanda de Paula Eduardo, doutora pela FO-USP, em sua tese de mestrado de 2001 e hoje é realizado em diversos centros odontológicos no país. No entanto, como lembra Ana, "Esse é um assunto novo, bastante estudado no momento. Por isso, ainda temos algumas dificuldades dentro dos hospitais. É preciso mostrar a importância e os resultados do tratamento para os médicos constantemente".
De acordo com o protocolo de tratamento desenvolvido por Fernanda, o ideal é que as aplicações de laser sejam diárias. No entanto, muitos pacientes não têm disponibilidade de comparecer ao laboratório todos os dias. Assim, o projeto propõe grupos de pacientes com diferentes freqüências de atendimento, o que permite que se estude a eficácia da terapia ministrada em maiores intervalos de tempo.
Ana lembra ainda que há uma terceira classe de pacientes, nos quais a mucosite se apresenta da forma mais severa, e que ainda não são atendidos pela clínica do Lelo. Pessoas que passarão por transplante de medula óssea recebem quimioterapia em doses altíssimas, pois é preciso destruir toda a medula já existente no organismo, para que se receba uma nova. Com isso, o paciente fica sem defesas imunológicas e não pode deixar o quarto do hospital, para evitar qualquer tipo de infecção. Dessa forma, seria necessário montar uma equipe que pudesse ir ao encontro do paciente para realizar os procedimentos odontológicos. Um grupo particular, formado por alguns dentistas do laboratório, atende esse tipo de paciente em hospitais privados. Tal atendimento a rede do SUS, de forma gratuita, é mais um passo que a clínica pretende dar.
Os hospitais conveniados à clínica de tratamento de mucosite oral do Lelo são: Instituto Arnaldo Vieira de Carvalho, Santa Marcelina, Beneficência Portuguesa, Santa Terezinha, Brigadeiro e Prof. Edmundo Vasconcelos. Pacientes de outros centros, no entanto, podem conseguir informações pelo telefone 3091-7645.