São Paulo (AUN - USP) - 1951: inauguração da Bienal de São Paulo, ano em que o Brasil tem a chance de ver e se comparar com o mundo artístico Europeu. Resultado, choque. Artistas se vêem diante de outra realidade e começam a repensar suas intenções, enquanto os críticos também se sentem inclinados a mudar sua visão – o mundo lá fora é abstrato. Não seria correto afirmar que o abstracionismo era um estranho desconhecido para o artista brasileiro. Muitos inclusive já vinham planejando essa fuga do figurativismo. Mas as tendências nacionais estavam distantes das vanguardas européias e o confronto era inevitável, e foi, sem dúvida, extremamente produtivo.
Esse choque de 1951 foi apenas o primeiro de muitos outros que a Bienal promoveu em seu espaço. Há 50 anos a fundação estimula o debate artístico, colocando em evidência as diferentes tendências e movimentos contemporâneos. E para celebrar seu cinqüentenário uma grande exposição está sendo organizada, Os primeiros 50 anos: Uma Homenagem a Ciccillo Matarazzo. A idéia é resgatar a importância desse verdadeiro fórum efervescente de novas idéias em homenagem àquele que o trouxe para o Brasil, Ciccillo.
Dividido em dois, o terceiro andar do Pavilhão conta com um núcleo histórico e outro contemporâneo, chamado Zona de Tensão. Abstracionismos – premiações da Bienal no acervo do MAC foi o nome escolhido para o núcleo histórico, curado por Helouise Costa. Como o próprio nome já diz, nele se encontram obras antes premiadas pela Bienal, e que agora fazem parte do acervo do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP), onde Helouise é professora e pesquisadora.
Para preparar o seu núcleo a curadora fez uma análise das premiações e confirmou a forte presença do abstracionismo, principalmente na década de 50 – na verdade, essa tendência chegou ao Brasil de forma definitiva graças à Bienal. “No primeiro momento há o antagonismo entre abstracionistas e figurativos” lembra Helouise, mas esses são logo superados graças ao contato com as tendências internacionais. Mas em um segundo momento surge um debate interno ao abstracionismo, de um lado o geométrico, do outro o informal, “embora formalmente muitas dessas obras sejam semelhantes, elas trazem a materialização de posições dos artistas em relação à Arte, em relação à sociedade, muito diferenciadas”. No início da década a vertente geométrica é muito mais presente, o que fica claro com a marcante premiação, na I Bienal, da escultura de Max Bill, Unidade Tripartida – obra que vai se tornar fundamental para o estabelecimento do concretismo no Brasil.
O abstracionismo geométrico propõe padrões de uniformização e uma nova relação com a indústria – tema que vai ser retomado pelos concretistas. Esse movimento é uma linha do abstracionismo geométrico que coloca a importância da autonomia da Arte em relação ao mundo visível; ao usar formas, linhas e planos independentes de qualquer referência externa, procura formular uma nova realidade em si. Com a Bienal e todas as questões retomadas a partir dela ocorre a formação de todo um grupo de artistas concretos no Brasil. Em São Paulo nasce o grupo Ruptura e mais tarde, no Rio, outro que acaba se opondo ao paulista e criando o Neoconcretismo, de Lygia Clark.
No entanto, mais para o fim da década de 50, o abstracionismo informal passa a ser cada vez mais premiado, polarizando o debate artístico. A principal crítica feita a esta vertente é a de que ela seria uma arte romântica, devido ao seu caráter essencialmente sensível – o abstracionismo informal tem como objetivo dar vazão à subjetividade do artista. Como o individualismo é muito presente, não há formação de um grupo para redigir um manifesto, portanto não houve uma colocação conceitual do movimento. Mesmo assim, ele foi muito bem aceito no mercado artístico, onde geométricos se colocavam com muito mais força, até como movimento de vanguarda.
A exposição do núcleo histórico Abstracionismos – premiações da Bienal no acervo do MAC trata portanto, dessas duas vertentes que tiveram como principal fórum de discussão a Bienal. Já o núcleo contemporâneo, com a mostra Zona de Tensão, tem curadoria de Maria Alice Millet e Daniela Bousso, além de trabalhos de arquitetura e projetos de design, curados por Pedro Cury e Marili Brandão, respectivamente. Cidade é o tema central desse núcleo, que deixa de fora os meios tradicionais da Arte para expor obras exclusivamente de fotografia, instalação e meios eletrônicos.
A exposição Os primeiros 50 anos: Uma Homenagem a Ciccillo Matarazzo vai ser aberta ao público essa quinta-feira e vai até 29 de julho – o Pavilhão da Bienal fica no Parque do Ibirapuera. O ingresso custa R$ 5, sendo que às quartas-feiras a entrada é gratuita. A mostra funciona de terça a domingo, das 10h às 21h.