São Paulo (AUN - USP) - O aconselhamento nutricional gera uma significativa melhora na qualidade de vida de portadores do vírus HIV. Esta foi a principal conclusão do ensaio clínico realizado pela nutricionista da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP), Luara Bellinghausen Almeida.
Apesar do avanço da medicina no controle da evolução da doença, os medicamentos anti-retrovirais ainda estão associados a vários efeitos colaterais. Entre eles está a alteração no metabolismo da gordura e na sua distribuição corporal, a lipodistrofia. Nesse caso, a gordura tende a acumular-se mais na região central, principalmente no abdômen, e diminuir nas regiões periféricas, braços e pernas, podendo aumentar os níveis de colesterol, triglicérides, o desenvolvimento de diabetes e de doenças cardiovasculares.
Com o objetivo de comprovar a associação entre alimentação saudável e prevenção da lipodistrofia, a nutricionista acompanhou durante um ano 53 portadores de HIV da Casa da Aids, aliada ao Hospital das Clínicas da USP. “Como não existem muitos estudos sobre o tratamento mais adequado dessas alterações, levantamos a hipótese de que a nutrição poderia ter um efeito de prevenir ou, até mesmo, tratar esses efeitos”, afirma Luara.
Os indivíduos selecionados foram divididos em dois grupos: um recebeu aconselhamento nutricional individualizado e o outro, chamado grupo controle, era somente submetido às avaliações.
Como todos os pesquisados ainda estavam em fase inicial de tratamento da Aids – até um ano – ainda não haviam apresentado nenhum sintoma da lipodistrofia. Assim, acredita-se que a pesquisa comprovasse o que prega a literatura, ou seja, que no período de 12 a 24 meses do início do tratamento, o indivíduo estaria propício ao aparecimento de alguma característica da doença. Porém, o resultado revelou que todos os pesquisados mantiveram-se saudáveis e não só o grupo de intervenção, como era o esperado.
Uma das hipóteses levantadas para o resultado, segundo Luara, é de que houve co-intervenção não-intencional nos indivíduos do grupo controle, já que, cientes de que estavam sendo monitorados, passaram a repensar seus hábitos, evitando ganho de peso e preocupando-se mais com o que comiam.
Outra possibilidade levantada é a tendência dessas pessoas, recém-diagnósticas, de aderir a qualquer mudança que traga benefícios de vida, como, por exemplo, o aumento do consumo de frutas, verduras, legumes e cereais integrais, importantes fonte de fibras, minerais e vitaminas. “Para metodologia da pesquisa o ideal seria que os indivíduos do grupo controle não mudassem nada na sua alimentação”, explica. Contudo, ela acredita que o resultado foi positivo no sentido de reforçar a importância da nutrição para a prevenção desses sintomas.
Um dos resultados que comprovou a efetividade do aconselhamento foi o aumento de quase o dobro do consumo de fibras no grupo de intervenção, saltando de 12,6g para 24g diárias no final do acompanhamento, muito próximo das 25 g recomendadas para adultos. O grupo também teve o índice de gordura diminuído, diferentemente do controlado que se verificou um acréscimo desse percentual.
A orientação baseou-se no padrão de aconselhamento nutricional estabelecido para quaisquer pessoas que procurem diminuir os níveis de colesterol, triglicérides e pressão arterial. Também houve a preocupação com a adaptação da dieta à realidade dos pesquisados, sua rotina e condição sócio-econômica, visando aderência à pesquisa. Além disso, o grupo orientado recebeu folhetos informativos com dicas para períodos de rejeição por parte do organismo dos medicamentos. “Por esses remédios terem uma metabolização complexa e os indivíduos ainda estarem no início do tratamento, as queixas de enjôo, intestino preso, diarréia, falta de apetite ou compulsão alimentar, dependendo da reação do organismo de cada um, eram freqüentes”, conta Luara.
Ela completa dizendo que apesar de não terem estatisticamente comprovado a hipótese inicial, durante o trabalho surgiram fortes indícios de como a qualidade de vida desses indivíduos foi melhorada com o suporte da nutrição.