São Paulo (AUN - USP) - "Cheguei ao exterior. E agora?". Kivia Costa sempre ouviu dos amigos o quanto aquela seria uma grande experiência. Museus para visitar, pessoas novas para conhecer, um idioma para aprimorar... Por que então ela sentia um vazio? Os dias foram passando e a estudante de jornalismo descobriu que viver em outro país só seria fácil se ela tivesse um objetivo definido a cumprir lá. Com isto em mente, ela trabalhou em um hotel norte-americano, foi Au Pair na Itália e hoje passa cada mês em uma cidade alemã diferente, hospedando-se em casas de família.
Para Gabriela Agustini, não houve tempo para se sentir confusa. Ela passou um ano inteiro em lua de mel com Londres. Claro que, de vez em quando, dava saudade do arroz com feijão da mãe, do pastel com caldo de cana, dos amigos da faculdade, dos dias de sol... Gabriela concluiu que morar na terra do chá era maravilhoso, mas voltar para casa seria ainda melhor. Não foi o que aconteceu. Assim que botou os pés no Brasil, a moça se sentiu deslocada, estranha. Parecia que tudo havia mudado.
Talvez a história de Kivia e Gabriela fosse diferente se elas tivessem procurado o Centro de Orientação Intercultural do Instituto de Psicologia da USP (IP-USP). Coordenado por Sylvia Dantas DeBiaggi, Ph.D em psicologia pela Universidade de Boston, o projeto é destinado a viajantes, recém-chegados do exterior, imigrantes e seus descendentes e ensina a lidar com o choque de culturas.
Não basta apenas pesquisar os costumes do país de destino. É preciso descobrir o que as mudanças significam para você. Isso não acontece de um dia para o outro, então Sylvia recomenda procurar o IP-USP de três a seis meses antes de viajar e assim que retornar. Na maioria dos casos, o estranhamento passa à medida que a pessoa se adapta aos novos costumes. Mas, se o choque cultural for grande, o viajante pode até voltar para casa antes do previsto.
Segundo Kalvero Orberg, o inventor do termo "choque cultural", o fenômeno tem quatro fases: o deslumbramento ("lua de mel"), o saudosismo ("negociação"), a aculturação psicológica ("absorção" da cultura diferente à sua própria) e o choque cultural reverso, quando se volta ao local de origem.
A última fase deriva da penúltima: "Há uma mudança no jeito de ser, de agir, nos valores. A pessoa se identifica com aspectos da outra cultura e os incorpora. Há então uma mudança em sua identidade cultural, em quem ela é", afirma Sylvia. "Ao voltar para casa, para o seio familiar, as pessoas acham que já conhecem tudo. Mas elas estão mudadas e o próprio país de origem também mudou, afinal todas as culturas são dinâmicas".
Há quem pense que a orientação intercultural é dispensável, já que a globalização reduz o choque cultural. Ledo engano. A própria professora Sylvia, que morou sete anos nos Estados Unidos, afirma: "devido à influência cultural norte-americana, o brasileiro acredita que já está familiarizado com aquela cultura. Mas uma coisa é assistir a seus filmes e programas de TV, ouvir suas músicas, experimentar sua culinária, tudo aqui mesmo, no Brasil, onde se faz apenas uma interpretação disso. Outra coisa é viver naquele ambiente todos os dias, onde acontecem concretamente as coisas a que apenas se assistia ou ouvia. A cultura norte-americana é, sim, muito diferente da nossa".
O centro de orientação intercultural ainda presta assessoria a empresas prestes a se internacionalizar e tem seu próprio núcleo de pesquisa. As mais recentes tratam dos dekasseguis (descendentes de japoneses que retornam ao japão) e de hispano-americanos dos países vizinhos. "O terapeuta intercultural é um curioso", diz Sylvia. Ele tem de conhecer as práticas culturais, história e geografia dos outros países, a fim de confrontá-la com as nossas.
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(11) 3091-4360, deixando nome e telefone para contato. As entrevistas acontecem no Bloco D do Instituto de Psicologia da USP