São Paulo (AUN - USP) - A busca por uma melhor qualidade de vida também motiva viagens de férias e imigrações de São Paulo para o interior do Estado. O ar puro que existia nessas cidades era a razão disso. Um estudo de dois cientistas da USP e da Unesp desmentiu esse mito. O cultivo e o processamento de cana-de-açúcar elevam o nível da poluição dessas cidades a um patamar próximo ao da capital.
No início de seu estudo, os pesquisadores confiaram nesse senso comum. O professor Amauri Pereira, do departamento de Meteorologia do IAG-USP, pretendia avaliar o grau de dispersão da radiação solar em São Paulo através de uma comparação de quanto era perdido na capital e em uma cidade de latitude e altitude similares. Botucatu era um modelo de cidade agrícola e não-poluída por indústrias ou automóveis, e, portanto, foi escolhida para ser analisada.
Durante cinco anos, dados foram coletados em uma estação em São Paulo e outra no campus da Unesp em Botucatu. No verão, a quantidade atenuada de energia do Sol por causa da poluição em São Paulo é superior à de Botucatu. Nesse caso, a diferença entre as duas cidades é da ordem de 15% da radiação recebida. Esse resultado era esperado pelos pesquisadores. Surpreendentemente, no inverno, a atenuação em Botucatu foi apenas 3% menor do que na metrópole.
Entre as muitas implicações causadas pela poluição, como problemas de saúde ou chuvas ácidas, está atenuação da radiação solar. O Sol emite energia na forma de radiação de freqüências diferentes, entre elas a luz. Essa energia é responsável pelo aquecimento do planeta, e, portanto, pelo clima da Terra. A poluição atmosférica atenua a radiação solar de duas maneiras: através da absorção dos gases poluentes e através do espalhamento causado pelos aerossóis poluentes em suspensão. Na prática, a atenuação pode ser sentida por nosso corpo. A paisagem urbana se torna um pouco mais esbranquiçada, irritando nossos olhos enquanto tentamos enxergar.
Botucatu é uma cidade cercada por plantações de cana de açúcar. Entre abril e setembro essas plantações são queimadas. Não coincidentemente, esse é o período do inverno, o qual há falta de chuva.A chuva dispersa os poluentes da atmosfera. Então, no inverno, soma-se a falta de chuva e a enorme quantidade de poluição gerada pelas queimadas da cana num processo altamente poluidor para a cidade de Botucatu.
Para o professor de física da Unesp de Botucatu, João Escobedo, todas as cidades do interior paulista onde existe plantação de cana de açúcar estão na mesma situação. Em seus estudos futuros, ele espera investigar quais são as implicações dessa poluição. Especula-se que alterações no ciclo hidrológico e no ciclo fisiológico das plantas da região central do Estado de São Paulo, entre outros problemas ambientais, possam ser causadas pela mudança na quantidade de energia dispersa.
Apesar do processamento da cana-de-açúcar em usinas também ser um processo poluidor, ele não deve ser o principal causador da poluição revelada pelo estudo. Nos últimos anos, essas usinas instalaram filtros que diminuíram significativamente seu efeito poluidor. As queimadas são as principais responsáveis pela poluição atmosférica no centro do Estado de São Paulo.