São Paulo (AUN - USP) - Kiko Goifman, 37, faz sucesso por ser radical na experimentação com a linguagem que usa para retratar diversos tipos de violência. Ele esteve recentemente na Faculdade de Direito da USP para exibir alguns de seus documentários e bater um papo com o Grupo de Estudos de Temas de Criminologia (GETCrim).
Em 1992, o antropólogo mineiro ganhou diversos prêmios no Brasil e em outros países como o documentário Tereza, que explora a questão do tempo na prisão. Em 2000 focou a violência contra idosos em Olhos Pasmados. 2003 foi o ano de 33, seu primeiro longa-metragem. Com 33 anos, para enfrentar o tabu da adoção, resolveu documentar sua própria busca pela mãe biológica, marcada para durar 33 dias. A ousadia do “diretor-personagem” rendeu-lhe elogios de Jean Claude Bernardet, mestre mundial do documentário. Segundo Kiko, a obra significou certa violência contra si mesmo.
Em 2004 entrevistou 17 assassinos de uma única morte para o filme “Morte Densa”. “São pessoas como qualquer um de nós que mataram num determinado momento. Foram anos de pesquisa para encontrar quem se dispusesse a mostrar o rosto. Usei o fundo preto, que não deixava ver o local da entrevista, para que o público não identificasse se o depoente estava preso ou não. Para mim é uma situação humana muito forte e específica, e não era isso que eu queria discutir”.
Kiko disse não conseguir separar vida pessoal e trabalho. “Um dos personagens de Morte Densa ligava freqüentemente em casa. Tempos depois descobri que ele estava preso porque matara pela segunda vez”. O diretor afirmou ser assustadora a quantidade de pessoas, principalmente entre os mais pobres, que tentaram solucionar a situação antes de cometer o assassinato, inclusive procurando a polícia. Vários atribuem a culpa do crime à vitima, e uma quantidade muito grande matou pelo azar de ter uma arma nas mãos. “Por isso sou contra o porte”, diz.
Kiko exibiu o CD-ROM interativo Valetes em Slow Motion, uma visita virtual a um presídio, e falou também de seu filme ainda não lançado Atos dos Homens. O documentário foi rodado nas cidades fluminenses de Nova Iguaçu e Queimados em 2005, uma semana depois do massacre de 29 pessoas por um grupo de policiais. A região é uma das mais violentas do país. “O que marcou essa filmagem foi o medo que a equipe experimentou. A cultura dos matadores é muito forte nessas cidades, onde eles já foram incentivados pelos comerciantes e outras pessoas bem-estabelecidas para reprimir os roubos. Um dia os justiceiros viraram os bandidos. Conversei com um matador clássico que ainda atua e acredita em coisas como matar para higienizar o mundo”, afirmou. Sobre o evento, o cineasta se disse feliz com o convite, que demonstra uma evolução do direito para uma posição mais interdisciplinar.