São Paulo (AUN - USP) - O espaço docente da Faculdade de Medicina da USP passou por um período de turbulência no último mês. A decisão do governador José Serra de transferir a gestão do futuro Instituto Doutor Arnaldo, o IDA, do Hospital das Clínicas para a Secretaria de Estado da Saúde causou rebuliço entre os professores da Universidade e desacordos entre o governo e os mesmos.
Miguel Srougi, a quem pertence a cadeira de Urologia, escreveu uma carta a seus colegas atentando para os riscos contidos em tal procedimento, ao que se seguiu uma série de entrevistas com o médico, que ficou em posição delicada devido o caráter de suas declarações. Ele afirmou que o instituto pode se transformar em instrumento de manipulação política, desagradando dirigentes do Estado, que interromperam mais uma vez as negociações.
Miguel afirmou estar chateado com o rumo tomado por suas declarações e prefere, agora, ficar à parte das discussões que envolvem o IDA para não mais prejudicar o andamento das negociações. A opinião que defende, porém, é partilhada por inúmeros médicos da faculdade, assim como outros colegas. O presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp), Cid Carvalhaes, concorda que o instituto é “uma moeda de troca política”. O hospital, idealizado na gestão Orestes Quércia, vem mudando de nome e conveniência ao longo dos anos sob consecutivas promessas de inauguração que nunca são cumpridas. A estréia deveria ter ocorrido em dezembro do ano passado, prazo máximo prometido pelo então governador Geraldo Alckmin.
O IDA “ainda não existe” (porque não foi inaugurado) e já tem muitos olhos voltados para ele. Será um hospital de grande porte e complexidade e custou ao erário público cerca de R$200 milhões, mais o valor da aparelhagem necessária e manutenção, estimada em R$180 milhões por ano. Médicos como Cid e Miguel temem que a administração do instituto seja transferida para a iniciativa privada (através de Organizações Sociais – OSs -, posição defendida pelo governo), pois, conforme diz Cid, isso contraria o rigor público, a destinação ao ensino, a prestação de serviço à comunidade e facilita o lucro. Ele afirma que os hospitais geridos por OSs “têm dado muito mau resultado” e que alguns rogam funcionar bem quando, de fato, fazem restrições de atendimento. Os casos mais graves, segundo Cid, são o Hospital de Cotia, Sanatorinhos Itu e Fundação Zerbini, que ainda não explicou o déficit orçamentário de R$250 milhões ocorrido em 2006.
Essa passagem seria realizada sob um contrato de gestão por transferência de responsabilidade gerencial, outorgando as OSs a administração do Instituto e a captação dos R$120 milhões anuais cedidos pelo governo. Cid salienta que a fiscalização desse dinheiro “é muito pobre” e que os administradores dessas OSs recebem “polpudos salários”, assim como aqueles que cedem a essa gestão. Ele e colegas do Sindicato acreditam que o hospital terá alas abertas consecutivamente no curso de 2008, “principalmente considerando que ano que vem é um ano eleitoral”.