São Paulo (AUN - USP) - Apesar de altamente domesticados, cães que vivem próximos a fragmentos de Mata Atlântica podem agir de maneira predatória e gerar impacto negativo na fauna local. O alto número de animais na região possibilita o surgimento de problemas como a transmissão de doenças e a diminuição da fauna nativa, o que torna essa ocorrência preocupante.
Pesquisa do professor de biologia da USP, Paulo Ignácio Knegt e da bióloga da Unicamp Patrícia Torres mostra que a grande quantidade de cães está ligada ao número de moradores da região: 90% das casas possuem o animal. “Os cães da zona rural são em geral para companhia ou guarda da casa. Alguns foram adotados, pois há o costume de pessoas da cidade abandonarem cães lá”, diz Patrícia. “Não é comum hoje em dia esses cães serem usados para caçar, já que a caça diminuiu muito no local”.
Entre os motivos que podem contribuir para esse comportamento, estão o pouco controle da reprodução dos animais e o hábito de mantê-los soltos. Cerca de 80% dos cães não são mantidos presos, o que possibilita que eles entrem nos fragmentos de Mata Atlântica e ataquem os animais nas bordas. Patrícia cita um outro trabalho, realizado na Mata de Santa Genebra, perto da cidade de Campinas (interior de São Paulo) que constatou que, na região, os alvos são pequenos mamíferos, como gambás e roedores. Há registro, entretanto, em unidades de conservação do cerrado, de ataques a animais maiores, como lobos-guará, feitos por cães que andam em bandos, em forma de matilhas.
Para a pesquisadora, o fato de os animais serem domésticos faz com que a responsabilidade seja da população. “No caso da zona rural, é necessário que esses donos tenham uma posse responsável do animal, que vacinem, alimentem, controlem a reprodução e mantenham os cães presos na propriedade”, diz. Mas mantê-los presos esbarra em barreiras culturais e físicas: grande parte das propriedades possui cerca de arame, que só impedem a passagem de animais maiores, como o gado.
Já na zona urbana, a pesquisadora diz que é mais fácil manter os cães presos, além de ser mais difundida a aplicação de vacina e a castração. O problema fica com a questão do abandono, que gera problemas de saúde, como a transmissão de febre maculosa. “Acho que programas que visem resolver problemas de saúde pública são mais aceitos pela população do que programas que visem apenas evitar que cães utilizem áreas da mata”. Para ela, é importante que se façam campanhas para mudança de hábitos, que irá evitar que cães venham a trazer impactos negativos para a fauna de fragmentos florestais.