São Paulo (AUN - USP) - Pesquisadores brasileiros alertam para o uso do termo ébriorexia como uma doença da moda. No último mês de março, o New York Times causou uma polêmica médica em torno do termo “drunkorexia”, ou ébriorexia. O termo trata de um quadro clínico de transtorno alimentar associado ao alcoolismo. Os estudos causaram furor pelos casos de celebridades hollywoodianas que sofrem com o problema, como a cantora Amy Winehouse.
A psicóloga Silvia Brasiliano, coordenadora do Programa de Atenção à Mulher Dependente Química, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, é especialista no tratamento de mulheres que apresentam os dois problemas associados. De acordo com a pesquisadora, o problema sempre existiu. No entanto, na sociedade atual de exposição e maior incentivo de consumo de bebida alcoólica, ele se torna mais evidente.
Já o pesquisador Niraldo de Oliveira Santos, psicanalista da Divisão de Psicologia do Hospital das Clínicas da USP, alerta para o uso possível do termo “ébriorexia” desde que não seja visto como uma categoria diagnóstica.” Se nos casos de bulimia, por exemplo, a impulsividade sempre esteve presente, quando esta ‘descarga’ se dá pela via da ingestão de álcool aponta para uma problemática a mais (tornando ainda mais complexo o tratamento), não se configurando um novo quadro clínico, bem como não é novidade na clínica”.
O problema é mais comum em mulheres justamente pela busca constante por um ideal de beleza estabelecido. Quando a paciente apresenta um transtorno alimentar, junto a ele, uma série de sintomas e quadros clínicos diferenciados podem se fazer presentes. A mulher com o transtorno alimentar tem uma visão distorcida do próprio corpo e está mais suscetível a acreditar em certos mitos sobre a alimentação. De acordo com Silvia, muitas mulheres acreditam que a bebida, por ser líquida, engorda menos que a comida, então para se livrar da ansiedade causada pela fome, elas bebem exageradamente.
Entre as meninas que sofreram ou sofrem com o problema, muitas disseram que a bebida é “anestésica”. “Primeiro que o líquido facilita o vômito quando forçado, segundo que oferece uma fuga da realidade. Hoje, eu estou em tratamento, então quando tenho uma crise é extremamente frustrante e a bebida funciona como um conforto para a minha aparente fraqueza”, afirmou Fernanda que não quis dar o sobrenome e faz tratamento no Hospital Graça de Ribeirão Preto.
A bulimia e a anorexia podem dessa forma estimular algum tipo de compulsão, que pode se manifestar com o abuso do álcool, ou ingestão de entorpecentes, ou ainda de drogas para emagrecimento, remédios antidepressivos etc. Trabalhando com mulheres que sofrem com os dois distúrbios associados, Silvia alerta para o tratamento individualizado da paciente. Para a psicóloga, também é necessário existir duas frentes de tratamento, a dos transtornos alimentares e a do alcoolismo.
Essa mulher que sofre com a “ébriorexia”, que é um quadro sintomático específico, mas não um diagnóstico, deve aprender a lidar com as pressões sobre o seu corpo e a visão que tem de si mesma. “A insatisfação com o corpo e a tentativa de obtenção de amor e aprovação nos laços estabelecidos têm levado mulheres maduras a ingressar na tirania de impor uma atitude de subversão às ofertas de superalimentação presentes hoje em nosso meio. Ou seja, se, por um lado, a oferta do prazer vinculado à comida é cada vez mais explícita, a negativa diante desta oferta exibe o próprio desejo de cada uma das mulheres contemporâneas ao que é próprio à subjetividade e à cultura – o alimento é o ‘necessário’, mas estar com o corpo perto do ideal é o desejado. O desejo humano subverte aí a natureza”, afirma Niraldo de Oliveira.