São Paulo (AUN - USP) -O Supremo Tribunal Federal está usando as súmulas vinculantes como um meio de legislar. A afirmação é do professor Alexandre de Moraes, doutor em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito da USP. Moraes foi um dos palestrantes do Seminário Internacional de Direito Constitucional que ocorreu recentemente na Faculdade do Largo São Francisco.
Em sua apresentação, o professor abordou a evolução da Jurisdição Constitucional no Brasil, apontando como principal mudança a forma do controle de Constitucionalidade, que passou a ser exercido de forma cada vez mais concentrada pelo STF, e do qual as súmulas são o passo mais recente.
O Controle de Constitucionalidade significa observar se uma lei ou decisão judicial atende ao que a Constituição ordena. Desde a primeira Constituição Republicana, em 1891, ele era feito de forma mais difusa, por todos os órgãos do Judiciário. No entanto, esse instrumento jurídico, que veio importado da constituição norte-americana, nunca teve muita eficácia em nosso país porque, entre outros aspectos, a parcela da população que tem acesso ao judiciário sempre foi muito baixa. “Poucos são aqueles que historicamente tiveram a efetividade dos seus direitos constitucionais (assegurada)”.
Segundo Moraes, a Constituição de 88 optou por um controle mais centrado da Constituição, oferecendo inclusive mais formas de se chegar ao STF, órgão responsabilizado por fazer esse controle. Como conseqüência, em pouco tempo quase tudo passou a ser assunto do Judiciário. Várias questões nacionais de grande repercussão começaram a passar pelo Supremo, desde medidas provisórias e planos econômicos e até o aborto de anencéfalos.
Súmulas genéricas
As súmulas vinculantes são o último capítulo desse processo de centralização. Para o professor, no entanto, o fato do STF poder emitir súmulas com base na interpretação da Constituição abre caminho para que os ministros façam papel de legisladores.
Isso porque a criação de uma súmula deveria significar que inúmeros casos parecidos já foram amplamente discutidos e tiveram o mesmo julgamento. Mas esse pequeno detalhe (baseamento na interpretação) está permitindo que a mais alta corte do país emita súmulas muito genéricas, que não abarcam somente os casos precedentes já julgados, mas também aqueles em que houve pouca ou nenhuma discussão.
Ele dá como exemplo dois casos muito divulgados na mídia: a súmula das algemas e a do nepotismo. No caso da súmula das algemas, o Supremo considerou somente três antecedentes para emitir uma súmula extremamente genérica. Moraes ainda chama atenção para o fato de que e o texto é praticamente idêntico ao da alteração do código de processo penal atual, prova de que o STF já estaria legislando de fato.
Com a súmula que cuida do nepotismo, a situação é semelhante. Só que, ao emitir uma súmula muito genérica, o STF permitiu que os senadores achassem brechas no texto que os dispensavam de demitir seus parentes em casos específicos. O problema, “Mas, para especificar a súmula, seria preciso criar outra súmula”.
O professor Moraes diz que o próximo passo da Jurisdição Constitucional será arranjar métodos de limitar ou racionalizar a edição das súmulas. Isso porque, além de dar possibilidade de o Judiciário fazer o que não é seu papel, elas são muito difíceis de anular. “Para declarar inconstitucional uma lei aprovada pelo congresso, são necessários seis dos 11 votos dos ministros do STF. Agora, para suprimir uma súmula que foi editada pelo próprio Supremo, são necessários oito votos em 11, um número altíssimo e que torna a anulação quase impossível”.