São Paulo (AUN - USP) -Os benefícios da atividade física aeróbica são conhecidos para a qualidade de vida e de saúde dos atletas. Entretanto, as adaptações do corpo a essas atividades podem trazer problemas, especialmente com relação ao sistema circulatório e o coração se o atleta já tiver uma cardiopatia (doença cardíaca) anterior à prática desses exercícios. É o que afirma Patrícia Chakur Brum, professora da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFE-USP), na palestra “Exercícios Aeróbicos e o Sistema Cardiovascular: do Atleta ao Cardiopata”, ministrada recentemente no Centro de Convenções Rebouças como parte do XXXI Simpósio Internacional de Ciências do Esporte.
O exercício físico em si não desenvolve a doença cardíaca. O que pode ocorrer, segundo Patrícia, é o agravamento da cardiopatia pré-existente através das adaptações que o corpo faz ao treinamento. Um exemplo dessas adaptações está nas dimensões do coração. Atletas tendem a ter a câmara cardíaca aumentada. O coração de uma pessoa que não se submete a tais exercícios com freqüência tem como medida do diâmetro do ventrículo esquerdo em diástole (movimento de dilatação) algo em torno de 50 milímetros. Entretanto, um atleta com uma grande capacidade adaptativa pode possuir a “mega-câmara”, ou seja, o ventrículo esquerdo tem aproximadamente 60 milímetros de diâmetro.
A professora afirma que essa adaptação é rara, mas, se ocorrer, os atletas entram na chamada zona cinza, que acontece quando não se sabe se as características do coração são fruto de uma forte adaptação aos exercícios físicos ou se já são resultantes de uma cardiopatia anterior. Para definir qual das duas hipóteses é verdadeira, Patrícia afirma que é recomendável a interrupção das atividades físicas: “um dos princípios do treinamento físico é a reversibilidade. Você pára de treinar e o coração ‘desadapta’, reduzindo um pouco o diâmetro se o caso for de uma adaptação fisiológica de grande magnitude”.
Se mesmo com a suspensão dos exercícios o coração não retornar às características anteriores, constata-se que o atleta já possuía cardiopatia e ele precisa parar suas atividades, sob risco delas causarem sua morte súbita. Para a professora, esse processo deve ser acompanhado por um cardiologista especializado em lidar com atletas, pois a decisão influenciará diretamente na vida profissional do mesmo.
Outro problema do coração que pode ser agravado com a adaptação do corpo a exercícios aeróbicos é a bradicardia sinusal de grande magnitude (redução na freqüência de batimentos cardíacos). Alguns atletas conseguem reduzir o número de pulsações por minuto de um normal de 70 para um nível próximo a 30. Em uma parcela pequena dos atletas, essa adaptação pode causar arritmias (falta de regularidade dos batimentos). Patrícia diz que, nesse caso de adaptação, “um ajuste na intensidade de treinamento e um acompanhamento periódico com um cardiologista especializado em atletas já é o suficiente”.
Ela ainda afirma que há ainda muito a se fazer para melhorar a detecção de cardiopatias pré-existentes em atletas para que sua participação em campeonatos seja segura. Como exemplo, ela cita os Estados Unidos que, mesmo tendo grande tradição esportiva, é um dos países que não inclui sequer o eletrocardiograma como exame pré-participação em competições de alto nível. No Brasil, a professora diz que esse acompanhamento é feito apenas onde há uma estrutura que os comporta: “vários times da Série A do Campeonato Brasileiro de Futebol, por exemplo, fazem exames de coração nos atletas antes de contratá-los. Há uma grande preocupação, mas isso acontece só onde há uma estrutura, pois a questão ainda é um problema”.