São Paulo (AUN - USP) -Pensar nas fachadas dos edifícios sem pichação, mofo ou traços de poluição atualmente parece impossível. No entanto, essa situação pode ser diferente daqui a alguns anos. É essa a promessa da pesquisa desenvolvida por Flávio Maranhão na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). O engenheiro aplica um método que torna auto-limpantes os blocos cerâmicos e demais materiais porosos.
O trabalho utiliza uma técnica que altera as propriedades superficiais dos produtos de acordo com a radiação ultravioleta – processo conhecido como fotocatálise heterogênea. "O material recebe uma radiação e emite uma radiação maior que recebe. Essa emissão destrói partículas de poluição e a pichação", afirma o pesquisador. Essa energia liberada é capaz também de eliminar microorganismos em pequenas proporções.
Maranhão utilizou materiais que contêm silício, como tijolos, telhas e granito. Neles foram aplicadas camadas das substâncias estudadas – capazes de mudar alterar propriedades superficiais dos blocos –, em dimensões nanométricas, da ordem de um milésimo de milímetro. O intuito desta ação é destruir as três principais causas da sujeira: a poluição, os microorganismos e a pichação. Dentre eles, apenas a última não se pode impedir que atinja os blocos, por envolver ação humana. Mas, segundo o pesquisador, o método "pode impedir que isso [pichação] fique lá".
Para evitar os microorganismos, o material não pode "gostar de água", pois é ela a responsável pelo seu crescimento. Outra preocupação é não permitir que a sujeira grude. Como isso é difícil de se evitar, o engenheiro explica que a poluição deve, no mínimo, conseguir ser lavada com a chuva. Por isso, o bloco deve, ao mesmo tempo, ter e não ter afinidade com água . Um dos desafios da pesquisa consiste justamente em conseguir juntar nas camadas essas características distintas e opostas – dessa "briga" resulta a limpeza dos blocos.
Preocupação ambiental
Além da economia com manutenção, o projeto visa reduzir os impactos ambientais. Para Maranhão, as edificações podem, inclusive, auxiliar na redução de poluentes. O princípio utilizado na pesquisa consegue destruir compostos orgânicos voláteis, os VOCs, nocivos à saúde humana. Em contrapartida, há liberação de CO2, cujo efeito deve ser levado em consideração, principalmente se o modelo for aplicado em larga escala.
No entanto, há certos entraves para que a técnica possa ser aplicada. Uma delas é a ausência de normas reguladoras de estudos da fotocatálise em materiais porosos, o que dificulta um intercâmbio de informações entre laboratórios, pois cada país faz suas adaptações.
Outro obstáculo é que, apesar dos bons resultados já obtidos, o método não está totalmente aperfeiçoado. Ainda há metas não atingidas, como conseguir determinar a ação da fotocatálise em todos os pigmentos da pichação. Além disso, por ser um método recente em escala científica, com menos de vinte anos de descoberta, são poucos que conhecem e trabalham com a técnica. Sem contar que o apoio financiador dessas iniciativas é restrito. "É um entrave grande", conta Maranhão.
Preço de mercado
Segundo Maranhão, o valor para o consumidor poderá aumentar caso o método seja implantado mais em decorrência de interesses comerciais do que pelo custo para produzir. "Para alguns materiais, o incremento do custo seria quase nada porque eles já usam uma parte dos materiais. Para outros, o incremento vai ser significativo", afirma o pesquisador. A durabilidade do material, teoricamente, seria muito grande. "Como é um princípio de liberação de energia decorrente da liberação de elétrons, em princípio, duraria para sempre. Mas não se sabe", declarou o engenheiro.
A técnica já foi testada em laboratório e ao ar livre com resultados satisfatórios. A expectativa é que se consiga implantar um projeto piloto para avaliar a eficiência do processo. No entanto, se depender do otimismo de Maranhão, as construções poderão, em breve, serem limpas sem esforço algum. "A gente conseguiu destruir pichação, o que, fora do país, não tinham conseguido", conclui.