ISSN 2359-5191

06/11/2008 - Ano: 41 - Edição Nº: 120 - Economia e Política - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
Otimismo do “não há crise” é equívoco do governo brasileiro

São Paulo (AUN - USP) -O combate à inflação não é prioridade no Brasil. O país deve concentrar esforços para garantir liquidez à sua economia e mantê-la de pé durante a crise econômica que atinge o mundo. Para isso, o primeiro passo é, segundo o economista e professor da Faculdade de Economia da USP Hélio Cruz, deixar de lado a postura otimista assumida pelo governo brasileiro nos últimos meses. Isso porque, no atual momento, a única certeza é que os efeitos da crise ainda serão mais profundos e nenhum país ficará ileso.

Cruz explica que tem havido um equívoco em diversos países, principalmente no Brasil, que ele denomina “conspiração benéfica”. “Todo o mundo está tentando amenizar os impactos dos problemas econômicos atuais, mas o capitalismo mostra ser o que sempre foi: um sistema sujeito a crises”, afirma o professor.

Trata-se de um “otimismo exagerado” pensar que dentro de alguns meses a situação estará melhor. Para Cruz, a magnitude dos desdobramentos da crise não combina com o discurso de que logo as condições da economia estarão recuperadas. “Fala-se em um novo Bretton Woods, mas ninguém considera o quanto isso vai demorar. Na crise de 1929 o processo foi demorado, houve ruptura de tudo o que estava ligado à economia de antes da crise”, explica.

O professor é categórico ao afirmar que a tendência é uma distribuição de perdas em todo o mundo nos próximos meses e, provavelmente, a mudança nos sistemas de poder, alterando a presente ordem mundial. “Portanto, diante da seriedade da situação, a arrogância de certos discursos que afirmam não haver crise, ou que ela não passará de uma ‘marola’, enquanto há tempestade no resto do mundo, deveriam ser deixados de lado”.

Uma das provas de que o país é tão vulnerável quanto os demais aos efeitos da crise é, segundo Cruz, a crise de liquidez do mercado financeiro no Brasil. Por causa dos temores que contagiam os mercados, todos os investimentos estrangeiros em ações de empresas nacionais, como a Vale do Rio Doce e a Petrobras, comercializadas com maior facilidade na BM&FBovespa (Bolsa de Valores de São Paulo), estão sendo desfeitos. Os países optam, em momentos como o atual, por levar seus dólares de volta à pátria, para garantir seus pagamentos em emergências.

A fuga de dólares, por sua vez, promove desestabilização cambial, desvalorizando a moeda brasileira frente à americana. Insumos e produtos importados têm seu preço elevado, pressionando a inflação. Taxas de juros são aumentadas, na tentativa de conter tanto a saída de moeda estrangeira como o consumo – para conter o processo inflacionário – e o que se tem é um ciclo que aprofunda os impactos da crise mundial na economia do Brasil.

Tudo o que se pode afirmar, de acordo com o economista, é que o mundo enfrentará um sério período de recessão, sem tempo previsto para terminar, nem meios para dimensionar as proporções dos impactos no mundo. E, em meio à turbulência, é preocupante não saber ao certo de o Brasil está preparado para isso.

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