São Paulo (AUN - USP) -A eleição de Barack Obama para a presidência dos Estados Unidos suscitou uma onda de esperança no povo americano. Em um país que já foi regrado por uma legislação racista, eleger um presidente negro representa simbolicamente uma vitória dos direitos humanos e a conquista da luta pela igualdade racial iniciada por Martin Luther King. Membro do partido Democrata, Obama não apenas representa a ascensão negra ao poder do país como uma resposta do povo americano contra a política militarista e conservadora no campo econômico do republicano George W. Bush.
Na opinião do especialista Carlos Eduardo Lins da Silva, membro do Gacint (Grupo de Análise da Conjuntura Internacional), ligado ao Instituto e Relações Internacionais (IRI) da USP, Obama não tem força política suficiente para promover grandes transformações na política econômica dos Estados Unidos. “As mudanças da política econômica nos EUA a partir da revolução conservadora do presidente Ronald Reagen são irreversíveis”, afirma Lins. “Eu não acho que o presidente Obama vá ter condições políticas de reconstruir algo parecido como estado do New Deal do presidente Franklin Roosevelt”, avalia. Porém, Lins não descarta a necessidade de uma intervenção estatal maior do que na era Bush, pelo menos nos primeiros anos de seu governo. “Mesmo o presidente George W. Bush, mais conservador, foi o primeiro a julgar necessário (a intervenção do Estado)”.
Segundo Lins, a deflagração da crise dos mercados financeiros em setembro e outubro deste ano foi fundamental para a eleição de Obama. “Embora (Obama) já tivesse apoio considerável de cerca de metade do eleitorado, as pesquisas anteriores (à crise) mostravam um equilíbrio muito grande e até uma certa superioridade de (John) McCain”. Obama passou a conquistar seu eleitorado nos últimos meses anteriores ao pleito nacional, com uma estratégia de campanha que Lins considera como ponto chave para sua vitória. “Obama conseguiu fazer uma identificação estreita entre McCain e o governo Bush, responsável pela crise”, afirma o especialista.
Tão logo saíram os números da eleição norte-americana e Barack Obama já anunciava para a imprensa o quadro da nova equipe econômica que comporá o novo governo e que terá que lidar com uma das maiores crises do capitalismo desde a queda da bolsa de 1929. O novo quadro é composto essencialmente por assessores da equipe econômica do governo Bill Clinton, governo este que foi marcado pela liberalização dos mercados financeiros norte-americanos. Essa escolha, na avaliação de Lins, é “natural e correta”, uma vez que o último governo democrata foi o de Clinton e desde então o partido tem sido dominado por uma mesma equipe.
A equipe do novo governo, no entanto, não será capaz de impedir a perda de poder político do país, que, segundo Lins, já não é de hoje. O papel de Obama, em sua opinião, seria amenizar as conseqüências desse processo para o povo norte-americano. “Obama tem todas as condições de fazer com que essa transição seja a mais fluída possível”, afirma.
De acordo com Lins, mesmo com um passado político curto e pouco conhecido politicamente pelo mundo, Obama tende a ser uma pessoa muito mais aberta ao diálogo com outras culturas e países e muito mais disposto à colaboração em entidades multilaterais. Nesse sentido, Obama poderá ser mais favorável à assinatura de acordos comerciais, ao Protocolo de Kyoto e inclusive acordos na Corte Internacional Penal, assim como a tendência é de que organizações como a ONU e a OMC sejam mais presitigadas.
América Latina- “A América Latina não vai ser prioridade para Obama assim como não foi para George W. Bush nem para nenhum presidente dos EUA”, pontua Lins. Por conta disso, a situação econômica de milhões de latino-americanos que vivem em condições de extrema miséria no continente tende a permanecer como está se depender apenas do novo presidente norte-americano. “A relevância da eleição do Obama para a América Latina é somente simbólica”, acredita Lins. “A situação só vai melhorar em casos específicos ou como conseqüência da melhora geral das relações internacionais no mundo por extensão”, acredita.
O especialista acredita que ainda há outras regiões do globo que requerem muito mais atenção e são muito mais relevantes para os EUA do que os países latino americanos. Porém, Lins acredita que haverá mudanças nas relações diplomáticas, mas que elas não ocorrerão da noite para o dia. “Mas acredito que Obama parece ser muito mais disposto ao diálogo e à concessão recíproca que Bush não só com (Hugo) Chávez e (Evo) Morales como com (Rui) Castro de Cuba também”, opina. Mas, segundo Lins, “é algo que vai exigir concessões de lado a lado”.
A Colômbia, que sempre foi um aliado do governo norte-americano, tende a continuar como aliado latino-americano dos EUA no governo Obama mesmo após o escândalo de que estourou recentemente de política de limpeza social promovida pelas Forças Armadas do país. “Obama vai tentar manter boas relações com a Colômbia principalmente por causa da questão do narcotráfico”, afirma Lins.
Já a China, na avaliação de Lins, não se constitui um inimigo econômico ou comercial para os EUA nos próximos anos. “Do ponto de vista político, China e EUA se entendem muito bem e vão continuar se entendendo”.