São Paulo (AUN - USP) - A crise energética e o racionamento do ano passado já mostraram ao país que o sistema energético brasileiro é insustentável. No entanto, os seus limites são maiores do que aparentam. Se mantivermos o atual modelo energético, o sistema entrará em colapso em 20 anos. Estas são as conclusões do professor Célio Bermann, do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP, em pesquisa realizada em conjunto com a ONG "Brasil Democrático e Sustentável".
O trabalho foi realizado durante dois anos e reunido no livro "Energia: para Que? Para Quem?", publicado pela Editora Livraria do Instituto de Física e lançado durante o Fórum Social Mundial de Porto Alegre. O objetivo do livro é apresentar de forma didática os limites do modelo energético e apontar saídas para a construção de uma alternativa sustentável para a geração de energia no Brasil.
Algumas informações do livro derrubam mitos consolidados no discurso dominante sobre energia. Por exemplo, ao contrário do que se pensa, as grandes usinas hidrelétricas não são fontes limpas e baratas de energia, mas são grandes emissoras de gases efeito estufa. Se todo o potencial hidrelétrico da Amazônia fosse aproveitado, o Brasil teria um crescimento de 75% das emissões de gases efeito estufa na atmosfera.
A razão disso é o fato de que nas usinas construídas até agora não houve a preocupação em retirar a cobertura vegetal do solo. Os gases emitidos pelos reservatórios são conseqüência direta do apodrecimento desta cobertura vegetal, e acabam poluindo a água e a atmosfera. "Dizendo em português claro, os reservatórios das usinas são grandes penicos", diz o professor Célio Bermann.
As termelétricas, apontadas como solução para a crise energética, também não são uma alternativa. De acordo com o estudo, as termelétricas previstas para serem instaladas até 2005 podem elevar a emissão de dióxido de carbono na atmosfera em 33%, o que significa 100 milhões de toneladas deste gás a mais por ano. O problema se agrava pelo fato de que a maior parte das usinas será instalada próxima aos grandes centros urbanos.
As saídas apontadas pelo estudo passam por uma relocalização das usinas termelétricas e pelo investimento em fontes alternativas como energia eólica, solar e biomassa. Só a cogeração de energia a partir do bagaço de cana, por exemplo, pode significar um acréscimo de 3000 MW ao sistema elétrico nacional. O potencial da energia eólica no Brasil chega a 29000 MW, quase o equivalente a todo o Programa Prioritário de Termeletricidade do governo federal, criado em função da crise energética de 2001.
Em curto prazo, o estudo propõe medidas como incentivo à cogeração de energia a partir de resíduos como esgoto, lixo e bagaço de cana, a substituição do diesel importado pelo óleo vegetal, a utilização do gás natural em ônibus e automóveis e a substituição do chuveiro elétrico por aquecedores a gás. "É possível acrescentar 23.300 MW ao sistema elétrico brasileiro sem construir grandes usinas termelétricas ou hidrelétricas", conclui o professor. Esta potência equivale a 33% da atual capacidade instalada do sistema elétrico.
Participaram do estudo organizações não governamentais como a FASE - Federação das Organizações de Assistência Social e Educação -, IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas -, PACS - Programa de Alternativas para o Cone Sul - e REDEH - Rede para o Desenvolvimento Humano. Além dessas, participaram o Programa Interunidades de Pós-graduação em Energia da USP e o IPPUR (Instituto de Planejamento e Pesquisa Urbana e Regional) da Universidade Federal do Rio de Janeiro.