São Paulo (AUN - USP) - Não existe controle de qualidade sobre a produção de própolis no Brasil, segundo Antônio Salatino, professor do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências (IB-USP), que conduz pesquisas laboratoriais sobre a própolis. “A substância nem sequer é analisada do ponto de vista farmacológico, podendo causar um sério risco à saúde dos consumidores”, afirma. Por esta razão, o professor e seu orientando de mestrado, Ricardo Gomide Woisky, escreveram recentemente uma série de propostas para a dosagem de constituintes normais da própolis, por meio de métodos simples e baratos.
A produção nacional de própolis tem sido favorecida pelas linhagens de abelhas que atualmente ocorrem no país. Nos Estados Unidos, na Europa e no Japão, por exemplo, as abelhas são suscetíveis a ataques de ácaros. O combate à praga é feito com acaricidas, compostos que funcionam como os inseticidas das plantas, e contaminam a própolis, que se torna nociva à população. O Brasil tem exportado grande parte de sua produção a essas nações, porque aqui ainda não se pratica o combate aos ácaros de abelhas.
Porém, Salatino alerta para um perigo ainda maior. “A ausência de análise experimental na própolis pode provocar uma série de equívocos quanto ao seu uso e indicação”. Praticamente em todo o mundo, inclusive no Japão – o maior consumidor de própolis do mundo e maior comprador da própolis brasileira – o composto é considerado “complemento alimentar” e não remédio. No entanto, todas as pessoas que consomem própolis não a têm como alimento, mas como medicamento. “É a partir daí que o erro começa: como complemento alimentar, a própolis não precisa passar por controle de qualidade apurado”, salienta.
Sem a análise, a própolis pode ser adulterada quimicamente, alterando assim suas propriedades terapêuticas. “Uma prática comercial pouco ética é adicionar à própolis substâncias estranhas, mas ativas farmacologicamente”, explica o professor. Sabe-se que foram encontrados, em amostras, antibióticos como a tetraciclina e o cloranfenicol. “O uso dessa ‘própolis aditivada’ pode ser devastador se o consumidor for alérgico a essas substâncias, sem mencionar o fato de que o consumidor típico de própolis é avesso ao uso de antibióticos”, avisa. Recentemente, pesquisadores europeus verificaram que a tinta utilizada para pintar as caixas das colméias contém metais pesados. “A presença desses metais contamina a própolis e também pode ser extremamente perigosa ao usuário”, adverte.
O risco, entretanto, não se trata de mera especulação. Há alguns anos, houve mortes na Argentina pelo uso do extrato de própolis que, a exemplo do que ocorre aqui, não passa por controle de qualidade. No caso, havia uma dosagem alta de álcoois tóxicos contaminando o etanol usado para a obtenção dos extratos. “A proposta de se institucionalizar o controle sobre o produto ainda não teve aceitação ampla, mas é perfeitamente viável e só traria benefícios”, ressalta o professor. Partindo de métodos e aparelhos relativamente baratos (o mais caro seria um cromatógrafo a gás), a análise seria relativamente simples. Verificações de teores de alguns componentes e seus efeitos permitiriam conclusões a respeito da eficácia da própolis no organismo.