São Paulo (AUN - USP) - Um estudo científico apresentado pelo médico, professor e chefe do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), Valentim Gentil Filho, comprova que o antidepressivo é mais do que um tratamento contra uma patologia. Antes disso, um efeito de regulação do humor. Ou seja, quando testado em pessoas saudáveis provoca, em uma porcentagem significativa delas, mudanças de comportamento.
Trinta por cento das pessoas analisadas relataram notar, após tomarem o medicamento em doses baixas, a ponto de não lhes dar nenhum efeito colateral, melhora no humor em situações adversas. O que eventualmente lhes causaria irritabilidade, como filas demoradas e sobrecarga de trabalho, foi tratado com mais tolerância e bom humor.
Para o psiquiatra, “normal é ter problema”. Problemas fazem parte da parcela saudável, se não quase total, da população. Como escolher, então, quais as pessoas consideradas saudáveis para a realização da pesquisa? “Precisávamos de pessoas que fossem mais normais que o normal da população”, diz o médico.
Através de uma solicitação feita por meio de vários e-mails de comunicação, apareceram cinco mil pessoas dispostas a participar da pesquisa. Dessas, entre cerca de 130 e 140 puderam realmente dar a sua contribuição. Foram aquelas que passaram pelo chamado critério de normalidade do pesquisador: nunca tiveram nenhum problema psiquiátrico nem emocional grave, eram dotadas de saúde do ponto de vista físico e não possuíam nenhum parente com qualquer distúrbio psicológico como depressão, pânico ou fobias.
Menos irritabilidade
O estudo surgiu a partir de relatos de pacientes tratados com esse medicamento, nos anos 80. Acometidos de pânico, eles tomavam uma dose mais baixa do antidepressivo e descreviam, além da melhora nos sintomas da patologia, maior tolerância e paciência nas situações do cotidiano, principalmente as mães de crianças pequenas com seus filhos.
“Não era o que a gente esperava. A gente esperava que o medicamento tratasse o pânico, tratasse a depressão, mas não interferisse nessa sensação de menos irritabilidade nas situações que elas estavam descrevendo”, constata Valentim Filho que, a partir de então, resolveu estudar o mesmo efeito em pessoas que não apresentavam sintomas, a fim de avaliar se o remédio alterava de fato a percepção das coisas irritantes do dia-a-dia.
Mesmo que pessoas consumam substâncias modificadoras de comportamento o tempo todo, como o álcool, o objetivo do estudo não é o mesmo. Ele não pretende mudar nem tratar de pessoas saudáveis, mas sim analisar o funcionamento do cérebro e da regulação do humor. Trata-se, antes de qualquer coisa, de uma busca para entender melhor o funcionamento da mente humana.