São Paulo (AUN - USP) - Quem nunca comeu um cachorro-quente recheado de tudo o que tem direito em uma barraquinha de esquina? E quem não conhece uma história de alguém que passou mal depois de se entupir com um “dogão” em fim de jogo? Pois muitas dessas constatações do dia-a-dia do paulistano foram colocadas à prova na dissertação de mestrado de Alessandra Lucca, na Faculdade de Saúde Pública da USP. Analisando a qualidade dos produtos necessários para a comercialização do sanduíche, a localização dos pontos de venda e o perfil dos vendedores e consumidores, Alessandra esquematizou dados até então desconsiderados pelas pesquisas públicas. Para isso entrevistou 134 consumidores 35 vendedores do famoso sanduíche.
Os vilões
Os cachorros-quentes comercializados nas peruas do tipo Towner são os que têm melhores condições de preparo e higiene. Os produtos ficam mais bem acondicionados e têm menos chances de deterioração. Mesmo assim, 95% dos ´dogueiros´ utilizam água de torneira para o cozimento da salsicha e outros. A infra-estrutura em geral é limitada: a refrigeração dos alimentos, lavagem das mãos, depósito de resíduos e o emprego de água potável são restritos a poucos pontos de vendas. Dos entrevistados, somente um vendedor trocava de luvas com periodicidade satisfatória. A manipulação dos alimentos e o armazenamento são os maiores fatores que levam as pessoas a terem doenças transmitidas por alimentos.
Quanto aos consumidores, Alessandra observou que a grande maioria é homem, com até 25 anos (60%) e solteiro. Perguntados sobre a razão de consumirem com freqüência o sanduíche, as respostas unânimes foram: sabor, preço acessível e rapidez no consumo.Quase a metade deles trabalha em área administrativa, sendo que uma grande parcela são ´office-boys´.
Ao contrário do que se pensava, os condimentos industrializados do cachorro-quente não têm péssima qualidade e não são diluídos. Os molhos de catchup e de mostarda são somente distribuídos em bisnagas menores. Novamente o problema está na não-refrigeração e pouca higienização dos tubos.
O purê de batatas, seguido pelo vinagrete foram os piores colocados quanto ao nível de bactérias. A batata tem alto risco de deterioração, principalmente porque os vendedores não dispõem de locais refrigerados para armazená-las. A multiplicação de bactérias é maior quando o tempo de espera para consumo aumenta e a temperatura é ambiente.
A verdade do mercado
A venda de produtos por ambulantes vem aumentando a cada ano. O fenômeno das peruas de cachorro-quente, junto com o comércio de outros alimentos de rua reflete uma vasta mudança no comportamento da sociedade e por isso, os serviços oferecidos também pedem transformação. À medida que a crise econômica do país se agrava, o mercado informal tende a crescer. O governo não pode fechar os olhos para essa nova fatia de mercado. “Há necessidade de reconhecimento da importância da atividade, assim como a aplicação de normas sanitárias (nos pontos de venda)”, conclui Alessandra. Além disso, com programas de difusão da regulamentação e higienização e cursos de capacitação, a situação dos ‘dogueiros’ sairia gradativamente da precariedade e disponibilizaria mais qualidade para o consumidor.
A tese de Alessandra Lucca “Cachorro-quente comercializado em locais públicos: pontos críticos e características do mercado” está disponível na biblioteca da Faculdade de Saúde Pública da USP.