São Paulo (AUN - USP) - O principal composto dos radiofármacos, o tecnécio-99, foi distribuído, no período de 15 a 22 de março, o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen, na USP), para hospitais de todo o País. No total foram distribuídos 326 geradores de tecnécio-99. Ainda mergulhado na crise do molibdênio-99 – matéria-prima para a produção do tecnécio-99 – o Brasil tem conseguido suprir o correspondente a 65% da demanda do material. Significa que em torno de 3.600.000 procedimentos médicos proporcionados, segundo dados do Ipen.
O molibdênio-99 é um isótopo radioativo, produzido com reatores nucleares, sendo matéria-prima para o tecnécio-99. Com este material são feitos desde diagnósticos em cardiologia até terapias contra o câncer. Dessa forma, o portfólio do Ipen conta com 44 produtos específicos para a área médica. Segundo seu superintendente, Nilson Dias Vieira Junior, o Ipen possui "uma das maiores radiofarmácias do mundo, correspondente a 4.4% da produção". Assim, atende 98% dos hospitais com clínicas nucleares do país.
O Instituto possui dois reatores nucleares de pesquisa, entretanto, nenhum deles tem condições de produzir molibdênio-99. Portanto, toda a matéria-prima para a produção de geradores de tecnécio-99 é importada e aqui processada. Assim, qualquer problema com os reatores dos países dos quais o Brasil importa o material afeta diretamente nossa produção de tecnécio-99. A crise começou em 2008 e seu agravamento se deu quando, no dia 19 de maio do ano passado, a principal empresa fornecedora de molibdênio-99m, MDS Nordion do Canadá, informou que o seu reator NRU ficaria parado por um tempo e assim teria dificuldades de fornecimento do material. "Ela era responsável por 40% das nossas importações", diz Nilson Vieira.
Com a lei da oferta e da procura, os preços acabaram por subir. "Hoje, o preço está quatro vezes maior que antes da crise", afirma o superintendente do Ipen. O instituto estava arcando com a diferença das despesas até fevereiro deste ano, quando o Ministério da Saúde passou a fazê-lo para não afetar o consumidor. "O Ministério foi recentemente envolvido, mas isso deveria ter ocorrido há mais tempo", ressalva o médico José Soares Júnior, presidente da Sociedade Brasileira de Biologia, Medicina Nuclear e Imagem Molecular (SBBMN), que explica que a grande burocracia foi e é um entrave para processos de urgência como este.
A ponta do ciclo, que corresponde aos pacientes, foi afetada diretamente. "Como 80% dos exames nas áreas de oncologia e cardiologia – as de maior mortalidade do país - são feitos com tecnécio-99, milhares de pacientes ficaram sem exame", explica o José Soares. Segundo dados fornecidos pelo Ipen, a demanda nacional aumentou em 15 vezes em questão de semanas.
O Brasil hoje importa o molibdênio-99 de quatro países. Na semana dos dias 15 a 22 de março, foram produzidos 88 geradores de tecnécio com o molibdênio-99 importado da África do Sul; 213 com o da Argentina; 13, de Israel; e 12, da França. Apesar destes números serem positivos, José Soares diz que não se pode esquecer que ainda estamos na crise. E enfatiza: "Ela não acabou e requer atenção contínua de todos, inclusive da população no sentido de reivindicar seus direitos".